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Notícias | Gramado SETEMBRO VERDE

Doação de órgãos: um ato de amor pelo próximo e que pode salvar oito vidas

No Hospital Arcanjo São Miguel, em Gramado, um comitê conversa com as famílias dos potenciais doadores

Publicado em: 22.09.2023 às 03:00 Última atualização: 22.09.2023 às 11:12

Em 27 de setembro se comemora o Dia Nacional da Doação de Órgãos. O mês também é chamado de Setembro Verde, um período de conscientização para esse ato, onde uma pessoa pode salvar até oito vidas.

Comitê que trabalha a doação de órgãos em Gramado, no Hospital São Miguel
Comitê que trabalha a doação de órgãos em Gramado, no Hospital São Miguel Foto: Fernanda Fauth/GES-Especial

Os transplantes ganharam novamente destaque em conversas e debates por dois motivos. Um deles diz respeito ao apresentador de televisão Faustão, que necessitou fazer um procedimento no coração, no final do mês de agosto.

Já o assunto também é falado pelos políticos de representação nacional. A Câmara dos Deputados aprovou, na terça-feira, dia 19, o regime de urgência para um projeto de lei que prevê que todo brasileiro será considerado doador de órgãos após a morte, a não ser que manifeste o contrário. Já no Senado, foi aprovado, na quarta, dia 20, um projeto de lei que institui a Política Nacional de Conscientização e Incentivo à Doação e Transplante de Órgãos e Tecidos.

Captador

Os procedimentos no Brasil são regulados através do Sistema Nacional de Transplantes. Uma lista única, federal, existe para cada órgão. Ela não é fixa, e os pacientes são inseridos conforme urgência e gravidade do seu quadro clínico.

Atualmente, no Estado, a fila de espera foi atualizada no dia 15 de setembro. Conforme a Secretaria da Saúde, são 16 pessoas aguardando coração; 1.187 córneas; 164 fígado; 64 pulmão; e 1.258 rim.

As cirurgias são realizadas em centros de alta complexidade. Apesar disso, em Gramado, no Hospital Arcanjo São Miguel, um comitê é formado por enfermeiros, médicos e psicólogos, cujo trabalho é focado na conscientização e conversa com famílias para obter potenciais doadores.

O grupo foi formado em 2009, entretanto, precisou dar uma pausa nas atividades durante a pandemia de Covid-19. As ações foram retomadas em janeiro deste ano.

Conforme a enfermeira e coordenadora de enfermagem da UTI do HASM, Gabriela Degaspari, o comitê se dedica à avaliação de potenciais doadores. "Fazemos as avaliações, acompanhamos o processo de diagnóstico da morte encefálica, a notificação dos óbitos. Damos auxílio às famílias também", diz.

"A captação e o transplante são diferentes. A captação é quando a família autoriza a doação. E, para isso, temos toda uma estruturação, com esse grupo. Existem duas formas de doação, quando o coração para de bater, pode ser doador de tecidos, ossos e córneas. Aqui, captamos apenas córnea. E tem também o óbito por morte encefálica, e aí o paciente pode doar múltiplos órgãos", justifica a diretora assistencial, Franciely Schneider.

Cerca de um terço dos entrevistados aceita procedimentos

Em 2018, o Hospital São Miguel recebeu uma menção honrosa do governador Eduardo Leite, por ter sido uma das casas de saúde que mais captou córneas.

Neste ano, até o momento, quatro pacientes foram doadores de córneas, totalizando oito captadas. Houve, ainda, uma captação de múltiplos órgãos em março, de dois rins e fígado, além das córneas. No total, 18 entrevistas foram realizadas. Assim, quase um terço autorizou os procedimentos.

"Por isso a importância de falar o desejo e a vontade de ser doador para as famílias, porque vemos que existe um desconhecimento mesmo", complementa a enfermeira Gabriela.

Outro medo, que por muitas vezes barra a doação diz respeito aos aspectos físicos do paciente que veio à óbito. "A equipe médica tem um cuidado muito grande nas suturas, para tudo ficar perfeito para o momento da despedida. Porque é uma fantasia da família e o medo de ficar alguma cicatriz. Entáo é feita toda uma reconstituição", explica a psicóloga Júlia Álvares.

Doações somente a partir de autorização

A abordagem é feita através de uma entrevista familiar. "Quem pode autorizar são parentes de primeiro grau, esposa e marido legalmente casados, filhos, irmãos, pai e mãe. No casos de menores de idade, os tutores legais ou pais. Eles precisam assinar consentimento de doação e o fluxo é diferente para cada captação", pontua Gabriela.

Nas doações de múltiplos órgãos, a Central de Transplantes em Porto Alegre é notificada. São feitos vários exames laboratoriais, para então, quando prontos, a fila "rodar" e se verificar quais órgãos poderão ser captados. Uma equipe vem da capital para fazer as cirurgias de retirada.

"Hoje, as doações só são possíveis se as famílias autorizarem, se não assinarem o termo de consentimento, não pode ser realizado. Se um familiar divergir, já seguramos o processo", afirma Gabriela.

Um medo que por muitas vezes barra a doação diz respeito aos aspectos físicos do paciente que veio a óbito. "A equipe médica tem um cuidado muito grande nas suturas, para tudo ficar perfeito para o momento da despedida. Porque é uma fantasia da família e há o medo de ficar alguma cicatriz. Então, é feita toda uma reconstituição", explica a psicóloga Júlia Álvares.

"Maior bênção de Deus que recebi"

Também é possível realizar transplantes em vida. Foi o caso do José Carlos da Fonseca, de 61 anos, de São Francisco de Paula, que recebeu uma doação de medula óssea de sua irmã, Maria José.

José Carlos com as três irmãs, durante o tratamento
José Carlos com as três irmãs, durante o tratamento Foto: José Carlos/Arquivo pessoal

No início de 2014, ele começou a ter os primeiros sintomas. "Suor noturno, pequenas manchas roxas nos braços, uma caminhada que me fez cansar muito", relembra. Ao realizar diversos exames, foi diagnosticado com leucemia mieloide aguda. A internação, ao final de março, foi imediata.

"Fui direto para a UTI e, no dia seguinte, comecei o tratamento com quimioterapia. Ao invés de ficar os 40 dias previstos, fiquei 80 devido a uma pneumonia por fungos", relembra José.

Os processos de quimio se tornaram constantes na rotina. Ele tinha quatro meses para realizar um transplante. "Se não fosse de alguém inscrito no Registro Brasileiro de Doadores Voluntários de Medula Óssea, poderia ser de uma de minhas três irmãs. A chance de ter uma com 100% de compatibilidade era de 75%. Em outubro, soubemos que seria a Zezé, minha irmã mais nova", diz emocionado.

Apesar das chances de recuperação estarem na época em 25% e haver os riscos do transplante, a fé o manteve firme. "Eu achava que nós dois iríamos juntos para o céu. Mas desde que concentrei minha fé inabalável em Deus me fortaleceu muito", revela.

Em 5 de fevereiro de 2015, ele recebeu a medula óssea da irmã. Em março, recebeu alta do hospital e ficou três meses em recuperação, em Porto Alegre. Atualmente, uma vez por ano, realiza exames no Hospital de Clínicas. Todo o tratamento foi pago pelo SUS. "Se não, eu não teria como pagar quase R$ 1 milhão", diz. "Agora é tudo normal como fazia antes do transplante. Fui patrono da Feira do Livro, estou escrevendo o quarto volume da história de São Chico e faço palestras", finaliza José.

Para a irmã, o agradecimento por ele estar bem é o mais significativo. "Foi a maior bênção de Deus que recebi, por poder salvá-lo. Passamos por momentos muito difíceis em 2014 e 2015", conta Maria.

Fernanda Fauth

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Fernanda Fauth

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