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Notícias | Mundo 30 anos da queda do muro

Os contrastes de uma Berlim dividida

Jari Mauricio da Rocha, escritor e professor leopoldense, transitou entre os lados Oriental e Ocidental do muro entre 1986 e 1988

Publicado em: 09.11.2019 às 05:00

No dia 17 de junho de 1987, o roqueiro David Bowie desembarcava em Berlim para um show que entraria para a história. Realizado do lado Ocidental do muro, centenas de fiéis seguidores também se aglomeraram do outro lado. Admirador confesso do camaleão, o escritor, professor e agente cultural de São Leopoldo, Jari Mauricio da Rocha, foi uma das 60 mil pessoas que se reuniram em frente ao Reichstag para prestigiar a icônica apresentação. A experiência rendeu uma crônica assinada por Jari, intitulada "O Camaleão", que compõe o livro publicado pela Carta Editora, em 2013. "Milhares de jovens se apinhavam naquele campo e cantavam com seu ídolo. Quando a música parou, começou-se a ouvir um ruído que parecia algum tipo de protesto. A gritaria, no entanto, vinha do outro lado do muro, que ficava imediatamente atrás do Reichstag. No lado oriental, outra multidão ouvia Bowie, mas não presenciava sua performance no palco. Aos gritos de 'nós também queremos ver', pessoas eram contidas pelos soldados soviéticos que não hesitaram em usar a força para dissipar os fãs, que, espantosamente, não se intimidaram. Ninguém podia impedi-los de ouvir. Percebendo isso, Bowie virou-se para o muro e falou antes de iniciar a próxima música: 'This is for You'. Modern Love uniu os dois povos pela primeira vez em vinte e seis anos."

O caminho até Berlim

Contraste. Esta é a palavra que define a Berlim de 1986, com a qual se deparou o escritor, professor e agente cultural de São Leopoldo, Jari Mauricio da Rocha, ao chegar na capital alemã, na época, ainda separada por um muro. "A imagem que eu tenho cristalizada logo que cheguei é muito emblemática: a Berlim Ocidental era colorida, e a Oriental era em preto e branco."

Sem perspectivas no Brasil e sem destino certo, aos 22 anos, Jari saiu do banco no qual trabalhava, em Novo Hamburgo, e decidiu se aventurar pela Europa. "Não tinha ninguém me esperando lá. Inclusive, precisei mentir para a minha mãe que uma família me acolheria. Na época, tudo era muito caro", lembra. O escritor viajou para Madrid somente com a passagem de ida, ficando duas semanas na capital espanhola. "Na sequência, peguei um trem e fiquei mais duas semanas em Paris e, de lá, parti para Berlim, onde decidi ficar."

Entre dois mundos

Embora estabelecido no lado Ocidental, Jari transitava frequentemente para a Berlim Oriental, onde fez diversos amigos. "Nós podíamos passar para o outro lado e ficar até 24 horas. Trocávamos 25 marcos ocidentais por 25 marcos orientais." Jari recorda de um fato peculiar para que a transição fosse permitida. "Quando se passava pelo Palácio das Lágrimas, os caras faziam uma única pergunta: se tu carregavas livros, revistas, armas ou munições", lembra.

Estado de sítio

Apesar da efervescência cultural e do pleno emprego, o estado de sítio era perceptível à população. "Tinha um cuidado quanto ao que se falava. Conversávamos baixinho. Existia um sensação de estarmos sendo vigiados, ao mesmo tempo em que as relações eram mais próximas. Mas para falar contra o sistema era preciso ter cuidado", lembra Jari. Do lado oriental tinha muita cultura. Tinha quadras esportivas enormes e shows de rock. Todo jovem praticava algum esporte. Quase todos tinham emprego e moradia. Apesar do baixo índice de desenvolvimento social e econômico em relação ao outro lado, havia adesão ao regime. Do lado ocidental havia pessoas com menos poder aquisitivo, mas a desigualdade não era tão acentuada. Ele exemplifica que o salário de um médico não destoava significativamente dos ganhos de um encanador. O leopoldense lembra de uma moça que trabalhava em uma chapelaria e era pintora. Diversos quadros dela saíram do país para exposições, mas ela não podia acompanhá-los. Segundo ele, ela morava em um apartamento sozinha com o salário da chapelaria.

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