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Notícias | Novo Hamburgo A filha da Carolina

Erika enfrentou a Covid ainda no ventre da mãe, e venceu

Gestante de 42 anos ficou 17 dias entubada na UTI com a doença; em seu ventre, Erika crescia. Recuperada, Carolina deu à luz a filha no Dia de Nossa Senhora Aparecida; Erika recebeu mais um nome na certidão: Vitória

Por Ermilo Drews
Publicado em: 29.10.2020 às 07:00 Última atualização: 29.10.2020 às 08:53

Carolina e Fabiano acompanham o crescimento da caçula Erika, hoje com 54 centímetros e 3.750 quilos de muita saúde Foto: Arquivo pessoal
Erika não foi planejada. Aos 42 anos e com dois filhos adolescentes de outro relacionamento, Carolina Müller não pensava em ter mais um filho. Com uma filha de 7 anos também de outra relação, Fabiano Pereira, 43, sim, tinha desejo de ter mais um. Mas o fato é que ambos não pensavam nisso como casal. E num ano em que todos planejamentos caíram por terra, Carolina descobriu a gestação em fevereiro, dois dias depois de pedir demissão. Com determinação de mãe, ela conseguiu um novo emprego. Mas aí veio março e você sabe o que aconteceu. Com a Covid-19 e o isolamento, o serviço sumiu e o contrato foi suspenso. Só que quem tem mais uma boca para alimentar sempre dá um jeito. E Carolina arrumou com um antigo patrão outro emprego, como supervisora de vendas em Porto Alegre. Uma rotina de acordar cedo e dormir tarde.

Apesar das incertezas de um ano cambaleante, a vida parecia entrar nos trilhos, mas o mundo não estava. Numa segunda-feira, um dos colegas de trabalho de Carolina apareceu com febre e dor no corpo. Na quinta, outro. No domingo, foi a vez dela. A dor no corpo virou febre no fim do dia. Bateu à porta do Hospital Municipal de Novo Hamburgo. Como era gestante, mandaram para casa tomar um remédio para dor muito comum nos balcões das farmácias. Os sintomas pioravam e na quarta-feira voltou ao hospital público, desta vez com a mãe, também com sinais da doença. A mãe foi atendida, mas a gestante cansou de esperar e deu um jeito de pagar por uma consulta. Nada adiantou. "Não posso fazer nada. Tu é gestante, não posso te medicar, melhor voltar ao hospital", disse a médica. Foram seis dias de febre até que uma radiografia e uma tomografia apontassem que o pulmão estava comprometido. A internação viria antes da hora para a mãe de Erika.

Com Covid-19, Carolina deu entrada no Hospital Municipal no dia 10 de julho, uma sexta-feira. Erika crescia há 24 semanas no ventre da mãe. No domingo, Carolina começou a piorar. Na segunda, a gestante do leito ao lado percebeu que algo não estava bem. Chamou a enfermeira, que acionou o médico. "Vai ter que entubar." A sentença que ninguém quer ouvir na pandemia. Dezessete dias da vida de Carolina passaram sem que ela percebesse. Neste meio tempo, os filhos foram amparados por professoras. Neste meio tempo, Fabiano foi amparado por um guarda ao perceber o desespero do motorista carreteiro que não conseguia dirigir o carro, tamanho o desespero com mulher e filha numa UTI.

A gestante acordou numa quinta-feira. "Achei que tivesse ficado três dias na UTI porque lembrava da decisão de entubar na segunda-feira. Uma técnica de Enfermagem me disse que foram 17 dias", conta Carolina. E com o coração de mãe, ela não pensou nela nesse momento. "Me deu um baque pensando no que meus filhos, minha mãe e meu marido passaram." No dia 3 de agosto, depois de 23 dias de internação, a boa notícia: alta.

A lista da gratidão é longa

Após a alta, o recomeço não foi fácil. "Quando cheguei em casa, não conseguia caminhar, escovar os dentes, levantar, comer. Tinha falta de ar, cansaço. Fui me recuperando aos poucos, com fisioterapia respiratória. Ainda tenho perda de memória e isso me deixa com medo de dirigir", conta Carolina. Mas se a mãe penava para se restabelecer, Erika crescia sem contratempos. Em 12 de outubro, Dia de Nossa Senhora Aparecida, da qual a família é devota, o milagre nasceu com 52 centímetros e 3.326 quilos. "Quis muito que fosse nessa data por gratidão à Nossa Senhora", admite a mãe.

E há espaço para mais na lista de gratidão de quem sobrevive e gera uma vida. "Agradeço a todos os médicos que nos atenderam, doutora Rayane, Simone, Bárbara, Luciano, às enfermeiras, técnicas, equipe de limpeza, administrativo do hospital, ao segurança que tratava muito bem o Fabiano, ao guarda municipal que deu uma palavra de solidariedade para ele; às professoras da escola dos meus filhos, que vieram aqui em casa conversar com eles, trouxeram presentes, se preocuparam com eles; a todo mundo que rezou pela gente, pessoas que não conhecia, pessoas que não via há 30 anos. Eu estar de volta e meu bebê ter nascido bem, depois de tanto remédio, é uma graça de Deus."

Não foi planejada, mas é muito amada

O feito conquistado pelas personagens desta história é tamanho que a pequena Erika Anna Vitória Müller dos Santos mereceu mais um nome na certidão de nascimento. Vitória é mais que o desejo de um pai que sofreu um bocado vendo o impacto que a Covid-19 pode provocar numa família. É uma marca para lembrar que aquele serzinho de 24 semanas resistiu à tempestade. Se Erika não foi planejada, chegou ao mundo sendo um símbolo de resistência e motivo de felicidade para Carolina e Fabiano. "Eu tive e me curei em casa. Mas a Carolina só piorou. Quando ela ficou internada, eu rezava todos os dias. Confiei que ela voltaria curada e com nossa filha. A gente estava juntos em pensamentos o tempo todo", lembra Fabiano. "Precisou de muita superação. Não é uma gripezinha", alerta Carolina.

Mas desde o nascimento de Erika, não há mais espaço para a angústia na casa da família no bairro Diehl, em Novo Hamburgo. "Agora é só alegria e vontade de viver", admite o pai. "Não dá tempo pra nada. A gente mal tem tempo para dormir. Nem lembro mais de cansaço, de falta de ar. Agora, é tudo com a Erika", diz a mãe. É a vida voltando ao normal.

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