Um casal vem usando crianças para furtos em mercados no Vale do Sinos. Nos últimos 15 dias, os ladrões agiram pelo menos 11 vezes na região, com casos documentados em Novo Hamburgo, Estância Velha, São Leopoldo e Portão. Um crime foi registrado em Imbé, no litoral norte. O casal se vale da mesma estratégia para fazer uma menina de aproximadamente nove anos sair despercebida com sacolas de compras, às vezes ajudada por um garoto com idade aparente de quatro anos. A suposta família usa um Corsa prata, ano 1995, emplacado em São Leopoldo.
A imagem é de uma inofensiva família no tradicional rancho. No caixa, os produtos vão passando pelo leitor de código de barras e são ensacados. Na hora de pagar, porém, o cartão de crédito não é aceito pela máquina. O casal se faz de surpreso, pede desculpas e diz que vai voltar depois com outro cartão ou dinheiro para buscar as compras, que geralmente ficam na faixa dos 500 reais. O que os funcionários não perceberam é que, nesse meio tempo, a menina já separou os produtos preferidos e os levou para fora, com auxílio do garoto.
TREINADAS
"Eles escolhem horário de movimento e usam as crianças, que parecem bem treinadas, para não levantar suspeita", comenta o presidente do Sindigêneros/Vale do Sinos, Juelcir Savanim, entidade que representa os mercados da região. Ele também foi vítima e alertou os associados por mensagem em aplicativo de celular. Ao perceber o prejuízo, vários mercados resgataram imagens do casal, que não são divulgadas para preservar a identidade das crianças.
A menina age com naturalidade e destreza. Caminha e corre entre os caixas e prateleiras. Parece uma criança feliz em compras com os pais. O garoto costuma aparecer depois e é orientado pela menina. Ele vem do Corsa, onde possivelmente há outro adulto aguardando. "Além do crime em si, é muito grave o que está sendo feito com essas crianças, ensinadas desde pequenas a roubar. O que vai ser delas?", questiona o sindicalista.
Na fim da tarde de quarta-feira, um comerciante do bairro Campina, em São Leopoldo, percebeu que recém havia sido vítima de furto e lembrou do alerta na rede. Correu para a rua e viu o Corsa prata estacionado perto de outro mercado. "Ele pegou de volta a mercadoria e impediu que agissem no vizinho", salienta Savanim. Mas o flagrante não intimidou o casal. Pouco depois, já estava em mercado no bairro Roselândia, em Novo Hamburgo, onde só não concretizou novo furto porque o dono já estava a par do crime. "Ele filmou o casal, que largou as compras e fugiu." O dono foi ontem à delegacia para registrar ocorrência.
O presidente do sindicato conta que a filial de sua rede, no bairro Rondônia, em Novo Hamburgo, foi vítima dos ladrões do Corsa prata no último dia 14, por volta das 18 horas. "O pessoal só percebe mais tarde, na hora de fechar a loja, pois a mercadoria fica guardada para o casal buscar depois." Na unidade, o casal passou R$ 473,24 em mercadorias. "Quando meus funcionários foram ver, perceberam que faltavam R$ 178,69 em produtos. Daí, ao verificar as imagens, vimos a menina levando as sacolas."
Os casos deixaram a maioria dos comerciantes em alerta na região, mas há os que ainda não tomaram conhecimento. Por isso, segundo o sindicato, os criminosos mantêm boa margem de mercados a serem explorados. "Um grande problema é que muitos não fazem ocorrência por medo de represália", ressalta o presidente do Sindigêneros. Savanim destaca que há mais dois adultos envolvidos. "Na Campina, tinha mais um homem e outra moça no Corsa. Não eram o casal que sempre aparece nas imagens."