As cenas são aterradoras. O cão é amarrado pelo pescoço em um poste de concreto, enquanto um homem o segura e outro o castra com facão. Sem anestesia. O animal grita e chora de dor. Os humanos dão risada, observados por um comparsa, que grava tudo. Há mais pessoas em volta dando apoio. "Se alguém quiser fazer curso de como castrar cachorro, chama nós", gaba-se um deles. Ontem, a Polícia Civil identificou quatro suspeitos, que serão indiciados por maus-tratos a animais no bairro Fazenda Pires, em Parobé. Um deles é bombeiro voluntário.
"Pelo menos outros três cães de rua passaram por essa atrocidade no local desde janeiro", comenta o delegado de Parobé, Rafael Sauthier. Ele apura o envolvimento de cada suspeito. "Sabemos que o bombeiro é quem corta. Participa ainda o funcionário de uma pedreira e o empregado de uma agropecuária. O dono da agropecuária também será indiciado, pois há indícios de autoria."
AMBIENTE
No fim da manhã, policiais e fiscais sanitários foram à agropecuária. "Constatamos que a frente do comércio é realmente o ambiente do vídeo", salienta Sauthier. Depois de ser multado por vender pássaros de forma irregular, o dono levou os agentes à casa do bombeiro. "É um funcionário da prefeitura cedido aos bombeiros, que estava trabalhando quando chegamos." O servidor foi buscado no quartel e levado fardado à delegacia.
Vizinhos ficaram revoltados com a crueldade ao assistirem a um vídeo da castração compartilhado no grupo de WhatsApp de moradores. "É horrível de ver. São vídeos e fotos terríveis", observa o delegado. Imagens chegaram a jovens que atuam em defesa dos animais, que procuraram órgãos públicos para denunciar. "Tão logo chegou ao nosso conhecimento, iniciamos a apuração dos fatos."
O delegado revela que o animal do vídeo mais chocante foi encontrado na casa do bombeiro. "O bichinho estava com manchas de um spray azul usado para hemorragia e infecção. Mais que uma forma totalmente inadequada de castração, sob todos os aspectos técnicos, é um crime repulsivo." Na noite de quinta-feira, segundo ele, outro cachorro de rua apareceu mutilado na área investigada, com hemorragia. "O animal foi socorrido e recebeu atendimento veterinário na fiscalização de Taquara."
De acordo com o delegado, somente o trabalhador da pedreira não foi encontrado ontem para depor. "Na segunda-feira, o inquérito vai para o Fórum, com todos já indiciados", frisa Sauthier. A pena para maus-tratos a animais vai de três meses a um ano de detenção, geralmente convertida em prestação de serviços à comunidade.
"Os três que ouvimos assumiram os crimes." Os nomes não são revelados porque os fatos ainda estão sob investigação. Outros moradores do bairro poderão ser indiciados. "Não foram possíveis prisões em flagrante porque os crimes ocorreram dias atrás." O delegado acrescenta que ainda vai ouvir testemunhas e funcionários públicos por possível omissão.