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Notícias | Região Indústria da bebida

Cervejeiros e técnicos garantem segurança no processo de fabricação de cerveja

Caso do rótulo Belorizontina, pela cervejaria mineira Backer, despertou o alerta no consumidor sobre como é produzida uma das bebidas mais consumidas no Brasil

Por Bruna Mattana
Publicado em: 23.01.2020 às 03:00 Última atualização: 23.01.2020 às 11:35

Processo de fabricação da cerveja Foto: Marina Mentz/GES-Especial

O caso de contaminação por dietilenoglicol e monoetilenoglicol em oito rótulos produzidos pela cervejaria mineira Backer levantou uma série de questões sobre processo de fabricação e controle de qualidade da bebida. O episódio, embora seja considerado único no Brasil e no mundo pela Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva), colocou o setor em alerta.

Até o momento, segundo a Secretaria de Saúde de Minas Gerais, já foram notificados 22 casos suspeitos de intoxicação pela substância - 19 homens e três mulheres. Ainda conforme a pasta, quatro casos tiveram a intoxicação confirmada e 17 estão sob investigação. Até agora, quatro pessoas morreram. Uma das vítimas, um homem de Juiz de Fora, falecido em 7 de janeiro, teve a contaminação confirmada. As outras três mortes estão sob investigação.

A ingestão de dietilenoglicol pode provocar a síndrome nefroneural e levar a insuficiência renal aguda e alterações neurológicas, como paralisia facial, embaçamento ou perda da visão, entre outros sintomas. O presidente da Abracerva, Carlo Lapolli, ressalta que o dietilenoglicol é uma substância utilizada por várias indústrias.

A Polícia Civil investiga o caso. Segundo o delegado Flávio Grossi, que preside o inquérito, a Polícia Civil não descarta nenhuma hipótese, nem mesmo a suspeita de que um ex-funcionário demitido pela Backer possa ter agido por vingança. "Não posso afirmar se foi uma sabotagem ou um erro. Ainda não é o momento da investigação para isso [...] o que afirmamos é que os elementos tóxicos encontrados nas garrafas [de cerveja], no sangue das vítimas e dentro das empresas [provêm] de produtos em comum. Crime, acreditamos que houve", disse.

*Com informações da Agência Brasil

Produção

Lapolli explica que a produção de cerveja inicia com a fervura dos ingredientes. "Depois, eles vão para tanques de fermentação, onde precisam ter a temperatura baixa (cerca de 0oC e em alguns casos menos). Para isso, serpentinas de inox circulam os tanques e dentro delas está um líquido que precisa fazer a temperatura se manter baixa durante a fermentação."

Ele destaca que compostos como o dietilenoglicol e monoetilenoglicol são utilizados nessas serpentinas, pois são considerados anticongelantes e permitem que os tanques atinjam a temperatura desejada pelo cervejeiro. "Importante ressaltar que as serpentinas são completamente vedadas e não têm contato com a bebida, por isso é tão difícil entender como ocorreu essa contaminação."

Processo artesanal

Na Cervejaria Mater, localizada em Dois Irmãos, o processo de fabricação da cerveja é acompanhado desde o início até o fim pelo empresário e cervejeiro Rodrigo Borowski, 31 anos. Ele conta que, como utiliza um circuito pequeno, usa somente água para resfriamento, a uma temperatura de 1 grau, patamar que não permite o congelamento. "De qualquer modo, o líquido não entra em contato com o produto".

Em relação ao estilo da cerveja, Borowski ressalta que varia conforme o malte e o lúpulo, nas quantidades e variedades. "O corpo de uma cerveja vai ser determinado pela quantidade de malte, também pela temperatura do cozimento, assim como a quantidade de teor alcoólico também. Já a cor da cerveja vai variar conforme vamos adicionando o percentual de malte de cevada, mais malte tostado ou mais maltes caramelizados. Essa composição vai dar um resultado diferente lá no final da produção. Com o lúpulo, a mesma coisa. Alguns dão mais amargor, outros mais aromas, dependendo da dosagem."

Por que não usar somente água na serpentina?

Lapolli destaca que, como o objetivo é baixar as temperaturas dos tanques para perto de 0 graus, a água, sozinha, congelaria, nesse caso. "A maioria das cervejarias utiliza álcool propilenoglicol e outras técnicas não-tóxicas para realizar o processo de resfriamento dos tanques", diz. Ele ressalta que a Abracerva encaminhou um pedido formal ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) solicitando o banimento dessa substância do processo de fabricação da cerveja.

Legislação

Conforme Lapolli, para que uma cerveja chegue às prateleiras, as fábricas passam por um processo de autorização e fiscalização intenso. "Toda cervejaria para operar precisa de um registro prévio junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. A empresa deve submeter uma série de documentações, inclusive o Manual de Boas Práticas de Fabricação e Planilhas Operacionais Padrão, descrevendo os processos produtivos, controles de processo, análises e registros básicos de qualidade. Após ter aprovada a documentação, há a realização de uma vistoria e estando tudo de acordo a liberação do registro é efetivada", pontua.

Diferença das substâncias empregadas

A engenheira química Flávia Costa Martins explica que o monoetilenoglicol (ou apenas etilenoglicol ou MEG) e o dietilenoglicol são substâncias químicas líquidas na temperatura ambiente, além de serem incolores e inodoras. "Ele altera as propriedades de ponto de fusão e ebulição da água. Isso impede que congele quando estiver muito frio e que evapore quando o motor estiver aquecido". "O grau de toxicidade do dietilenoglicol é maior do que do mono, pois a quantidade mínima para intoxicar o ser humano é muito menor do primeiro em relação ao segundo", explica.

O etilenoglicol usado como líquido de resfriamento não tem contato direto com o produto, pois fica dentro de serpentinas. "A contaminação pode ocorrer apenas se houver problemas de isolamento nas tubulações, falta de manutenção e corrosão nas mesmas", salienta.

Segundo a engenheira, as manifestações clínicas ocorrem em três fases: sintomas, podem haver já sonolência; De 1 a 3 dias depois, piora e insuficiência renal aguda. De 5 a 10 dias, perda parcial dos movimentos.

AGM orienta fabricação

O presidente da Associação Gaúcha de Microcervejarias (AGM), Diego Machado, lamenta o ocorrido e diz que a associação está fazendo o possível no intuito de orientar os associados para que tenham cuidado no seu processo de fabricação. "Acreditamos que os cervejeiros gaúchos estão cientes e farão o possível para que não tenhamos nenhum tipo de caso semelhante no Estado", ressaltou Machado.

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