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Notícias | Região Crime

Tribunal mantém absolvição de acusados de matar padre em Novo Hamburgo

Como os dois beneficiados pela sentença são os únicos réus, deve ficar sem solução o latrocínio de sacerdote no Parcão, que completa oito anos nesta quarta-feira

Por Silvio Milani
Publicado em: 15.12.2020 às 21:01

Após morte do padre e professor Eduardo, Corsa foi abandonado em Campo Bom, perto das casas dos réus Foto: Arquivo GES
Nesta quarta-feira (16) quando o crime completa oito anos, o Ministério Público analisa se ainda cabe recurso ou se o processo do latrocínio (roubo com morte) do padre Eduardo Teixeira, no parcão de Novo Hamburgo, será arquivado como caso sem solução. Na quinta-feira passada, por unanimidade, a 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça manteve a absolvição dos dois acusados. Os três desembargadores concordaram com a sentença do juiz da 2ª Vara Criminal de Novo Hamburgo, Marcos Braga Salgado Martins, de que não há prova suficiente para condenação. A família da vítima e a Promotoria, que recorreu ao TJ, discordam. Os réus, de 36 e 18 anos na época do fato, chegaram a ficar 30 dias presos. Moradores de Campo Bom, eles sempre alegaram inocência e teriam apresentado álibis.

Os depoimentos contraditórios de outro sacerdote, considerado vítima sobrevivente do latrocínio, foram decisivos para a absolvição. Na delegacia, o padre Rafael Barbieri reconheceu os dois suspeitos, mas, no depoimento em juízo, disse que não tinha certeza. "Não tendo sido a vítima sobrevivente capaz de reconhecer, com certeza, os acusados e nada mais havendo, de concreto, a demonstrar a autoria desses no crime, impõe-se, na dúvida, seja essa interpretada em favor dos réus", concluiu o relator do processo no TJ, desembargador José Ricardo Coutinho Silva. Os colegas Ricardo Bernd e João Batista Tovo acompanharam e decisão de negar recurso do MP, que queria condenação.

''Imprestáveis''

A mãe do padre morto, a calçadista aposentada Atelma Teixeira, 61, se diz decepcionada com o colega do filho. "Parece que tinha medo que os bandidos fossem atrás, mas era dele, ainda mais como padre, a obrigação de honrar a memória do amigo, pois estavam juntos." Barbieri falou ao juiz que fez o reconhecimento em momento de comoção na delegacia porque a mãe do colega morto estava no local. Poucos dias após o crime, o sacerdote foi transferido do Vale do Sinos para a paróquia de Canela. Está proibido pela igreja de falar sobre o caso. Na sentença, o juiz de Novo Hamburgo definiu os reconhecimentos do religioso como "imprestáveis."

O crime e um longo processo judicial

Na noite de 16 de dezembro de 2012, um domingo, o padre Eduardo Teixeira, 32 anos na época, saiu de uma janta em Estância Velha com o colega de batina Rafael Barbieri, então com 35 anos, na carona.

Na Rua General Daltro Filho, bairro Hamburgo Velho, em Novo Hamburgo, dois homens armados entraram no Corsa conduzido por Teixeira, de propriedade da paróquia de Campo Bom. Segundo Barbieri, o colega ofereceu carona aos desconhecidos para ajudarem a chegar à igreja do bairro Rondônia.

O primeiro destino, conforme Barbieri, era a paróquia do Rondônia, onde ele seria deixado. Teixeira seguiria até a paróquia Santa Teresinha de Campo Bom, seu local de trabalho.

Na Rua Barão de Santo Ângelo, em uma trilha do Parcão, Teixeira foi morto com um tiro no peito, às 23h50. Ele teria reagido ao assalto. Os ladrões roubaram a carteira com documentos e dinheiro e fugiram no Corsa. Também teriam levado 130 reais do padre sobrevivente.

Barbieri chamou a Polícia e informou que foram vítimas de um assalto. O Corsa foi abandonado uma hora depois na Rua João Correia, no bairro Vila Rica, em Campo Bom. No veículo ficou uma maleta de Teixeira com doações de fiéis.

No mês seguinte, os dois suspeitos, que seriam moradores da Vila Rica, foram capturados por meio de prisão temporária de 30 dias. A Polícia pediu as preventivas, mas a juíza Andréa Hoch Cenne, por entender que as provas eram frágeis, decidiu colocar os acusados em liberdade.

A dupla só foi denunciada pelo Ministério Público em janeiro de 2014 e julgada em julho de 2018 pelo juiz Marcos Martins. Com a absolvição, a promotora Roberta Gabardo Fava recorreu ao TJ, onde a apelação foi julgada e negada no último dia 10. O Ministério Público analisa se cabe novo recurso.

 

Réus foram ao velório

Os réus foram ao velório do padre em Sapiranga. Ainda nem eram apontados como suspeitos. O detalhe surreal do caso foi revelado pela mãe da vítima. "Quando informada que tinham prendido os bandidos, fui à delegacia. Para minha surpresa, eu os reconheci. Tinham estado no velório do meu filho. O que atirou chegou perto do caixão e ficou olhando para o corpo, enquanto o outro permaneceu na porta. Antes do velório, eu nunca tinha visto eles."

'É muita dor para uma mãe'

O padre Eduardo também era professor estadual de filosofia em Sapiranga. "Meu filho estava no terceiro ano de sacerdócio e era concursado do Estado. Lecionava na segunda-feira, nos três turnos, quando tinha folga na paróquia. Somos uma família de poucos recursos. A gente lutou muito para dar estudo ao Eduardo. Aí vem uma pessoa, tira a vida dele e fica como se nada tivesse acontecido. É muita dor para uma mãe." Ela lamenta a falta de condições financeiras para acompanhar o processo. "Tenho fé em Deus que um dia se faça justiça. Se eu tivesse pago um advogado, talvez a gente tivesse conseguido. Mas não temos condições. O que matou meu filho tinha advogado particular." Quatro anos depois do crime, ela perdeu o outro filho, Adriano, 33, para o câncer.

 

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