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Notícias | Região Investigação

Dois gestores estão entre os oito indiciados pelas seis mortes no Hospital Lauro Reus

Veja como falhas dos últimos dois dias na manutenção do sistema de oxigênio foram decisivas para a tragédia

Por Silvio Milani
Publicado em: 18.06.2021 às 21:36 Última atualização: 18.06.2021 às 21:44

O desespero tomou conta da instituição na manhã de 19 de março Foto: Arquivo GES
A tragédia de 19 de março no Hospital Lauro Reus, em Campo Bom, quando seis pacientes de Covid-19 morreram por falta de oxigênio, resultou no indiciamento de dez investigados. Oito foram enquadrados em homicídio culposo e dois no crime de falso testemunho, entre profissionais vinculados à instituição de saúde e à fornecedora de oxigênio. O inquérito foi concluído nesta sexta-feira (18) e remetido ao fórum.
Apontando “várias negligências encontradas” nos três meses de investigação, o delegado Clóvis Nei da Silva responsabilizou pelas mortes dois profissionais ligados à gestão do hospital, Jorge Ricardo Pigatto, diretor-executivo da Associação Beneficente São Miguel, e a então diretora administrativa do Lauro Reus, Melissa Fuhrmeister Cândido. Ainda pelo hospital, foram indiciados quatro funcionários da manutenção – Jeferson Miranda, Paulo Ricardo Lopes, Douglas Gomes e Diordinis Maciel de Mello.

A fornecedora

Também responderão por homicídio culposo o representante comercial da Air Liquide do Brasil, Marcelo Sauner Júnior, e o colega Bruno Elias de Souza, encarregado da programação dos abastecimentos. São da empresa os dois acusados de mentir nos depoimentos – Sérgio Aguiar e André Luís Michel.

 

'Jamais esperava uma decisão dessa', diz diretor acusado

O diretor-executivo diz que recebeu com surpresa a informação do indiciamento. “Jamais esperava uma decisão dessa. Estou esperando parecer do meu advogado para tentar entender, porque ainda não tivemos acesso ao inquérito”, declara Pigatto.

Para ele, o problema foi concentrado na falta de oxigênio. “Isso ficou bem claro no nosso relatório. Estou triste com a fatalidade do dia 19, mas ao mesmo tempo querendo respostas.” E mencionou atribuições.

“A gente está em momento pandêmico, trabalhando incansavelmente, só que o hospital tem uma direção técnica e uma direção administrativa. Não me envolvo no dia-a-dia do hospital. A gente não imaginou que seria em nível de direção (o indiciamento) porque todos os procedimentos foram atendidos.” A reportagem não conseguiu contato com a ex-diretora administrativa e com os servidores da manutenção.

 

Empresa emite nota

Questionada sobre os atos de “negligência” apontados pela Polícia contra a empresa e funcionários, a fornecedora de oxigênio emitiu nota.


“A Air Liquide se manifestará somente após ter acesso ao relatório final das investigações, o que ainda não ocorreu. Reitera, no entanto, sua postura de total colaboração com as autoridades e investigações em curso.”

 

Relatos dramáticos isentaram corpo técnico

Nenhum médico, enfermeiro ou técnico de enfermagem foi indiciado, segundo o delegado, “porque agiram no limite de suas possibilidades no intuito de salvar a vida do maior número possível de pacientes, no trágico incidente”. No desespero da falta de oxigênio, com pacientes agonizando na asfixia, o médico da UTI orientava técnicos a socorrer os doentes com maiores chances de sobrevivência. O dilema era quem receberia o único equipamento de ventilação manual. Oito teriam sido salvos dessa maneira.

 

E agora?

Equipe do Hospital Lauro Reus molha tanque de oxigênio Foto: Arquivo pessoal
O inquérito vai para análise do Ministério Público, que decidirá se denuncia os indiciados, pede aprofundamento nas investigações ou acusa outros possíveis investigados. Se o juizado criminal aceitar a denúncia, imputados se tornam réus.

Os oito acusados de homicídio culposo, morte qualificada pela imprudência, podem pegar de um a três anos de prisão, com possibilidade de aumento de um terço na pena pela inobservância de regras técnicas da profissão. Os dois indiciados por falso testemunho estão sujeitos de dois a quatro anos de reclusão.

As vítimas*

>> CARMEN DE FÁTIMA LICZBINSK, 66 anos
>> FERNANDO CORÁ DA SILVA, 39 anos
>> MÁLSIA BEATRIZ MAUSER, 48 anos
>> SURAí SILVA DA SILVA, 51 anos
>> VANI HELOÍNA DIESEL, 66 anos
>> ZELI MARIA DIAS, 59 anos

*Outro inquérito apura pelo menos mais três mortes pela falta de oxigênio


Como aconteceu

18 de março
7 horas - Auxiliar de manutenção faz leitura de 39% no tanque principal e informa seu superior.
16h45 – O funcionário faz nova leitura antes de deixar o hospital e informa que o tanque está em 23% de carga.
17h15 – Um superior telefona para o número 0800 771 6686 e solicita reabastecimento para a empresa Air Liquide.
19 horas – Outro funcionário da fornecedora informa que o reabastecimento do tanque principal deveria ocorrer no final da manhã do dia seguinte. Nesse momento o nível do tanque principal está em 20%.

19 de março
7 horas - O nível do tanque principal atinge 02%.
7h20 – Na leitura diária, o funcionário constata que o tanque está com apenas 0,006% de carga de oxigênio líquido.
7h25 - O tanque principal fica com 0,04%, segundo telemetria da Air Liquide.
Entre 7h30 e 7h45 - Os respiradores da UTI emitem sinal sonoro acusando que a pressão de oxigênio não é suficiente para manter os aparelhos funcionando. O pânico começa a se espalhar pelos corredores do hospital.
8h10 – Funcionários tentam acionar as baterias. A Air Liquide é informada e desloca um caminhão com cilindros de oxigênio gasoso e um caminhão-tanque para reabastecimento.
8h31 - A pressão mínima para os respiradores é atingida e os pacientes voltam a ser conectados aos aparelhos ligados à tubulação.
8h50 - Seis mortes já estão confirmadas.
9h53 - Chega o caminhão-tanque e começa o reabastecimento, que se estende até cerca de 10h25.

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