Brasil precisa 'avançar, e não retroagir', diz ministro Marco Aurélio sobre voto impresso
Prestes a se aposentar, decano do STF falou sobre a carreira e a polêmica em torno das eleições em entrevista exclusiva à Rádio ABC; ouça
Prestes a aposentar a toga, o decano Marco Aurélio Mello deixa o Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 12 de julho, quando completa 75 anos – idade-limite para a função. A saída o juiz carioca ocorre após 31 anos de STF. Em entrevista exclusiva à Rádio ABC 103.3 FM, na manhã desta quarta-feira (7), Marco Aurélio falou sobre a carreira e polêmicas da política brasileira.
Entre os assuntos, o ministro criticou a implantação do voto impresso no País. "Nós precisamos, no Brasil, avançar, e não retroagir. Não vejo, como o presidente da República, Jair Bolsonaro, sustentar a possibilidade de fraude já que ele foi eleito por este mesmo sistema. E foi eleito como requer a Constituição, com a maioria dos votos válidos", ressalta.
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O decano sustentou o motivo pelo qual entende que a urna eletrônica é segura. "O voto é computado na urna, as urnas não são interligadas, as urnas têm um disco fixo e um móvel. O disco móvel é recolhido e, ao final destes votos, o eleitor recebe o comprovante de que votou. Agora, não se tem, evidentemente, a impressão imediata do voto, tal como formalizado pelo eleitor."
Segundo Marco Aurélio, já houve tentativa de voto impresso no País, mas a experiência foi "catastrófica".
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Desde 1990 no Tribunal, Marco Aurélio teve seu nome ligado à alcunha de "o ministro do voto vencido" e dos habeas corpus impopulares. O mais recente foi a decisão monocrática de conceder, em outubro passado, liberdade ao traficante André do Rap, ligado à facção criminosa PCC em São Paulo.
Na ocasião, o ministro argumentou havia expirado o prazo da prisão preventiva sem que tivesse ocorrido renovação da decisão, ou sentença condenatória definitiva. O traficante foi solto e, agora, encontra-se foragido. O caso foi levado ao plenário, que isolou Marco Aurélio: foram nove votos favoráveis ao retorno de André do Rap à prisão. Foi assim também quando o plenário julgou os habeas corpus concedidos pelo decano ao ex-banqueiro Salvatore Cacciola; ao goleiro Bruno e a Suzane Von Richthofen.
Num caso de decisão individual que resultou em crise entre os poderes, Marco Aurélio concedeu, em 2016, liminar provisória para afastar o senador Renan Calheiros (MDB-AL) do cargo de presidente do Senado. O ministro fez valer a jurisprudência da Corte de que réus não podem ocupar a linha sucessória da Presidência da República. Dois dias depois, porém, o plenário desfez a medida e reconduziu Renan ao posto, com a condição de que não assumisse o controle do País.
Levantamento feito pelo pesquisador Jeferson Mariano, doutor em ciência política pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e estudioso do Judiciário, aponta que Marco Aurélio apresentou votos isolados do restante do colegiado em 13,52% das ações que tratam da constitucionalidade dos atos ou omissões de outros Poderes. O estudo considerou os 3.738 julgamentos colegiados entre 1988 e 2017 - o decano participou de 3.098 votações.
Mariano avalia que Marco Aurélio se dedicou mais a expor para o público aquilo que lhe pareciam as fragilidades das decisões da Corte do que em colaborar com a formação de maiorias. "O ministro acabou se tornando uma espécie de ombudsman no Tribunal", afirma Mariano. "A marca de sua atuação foi a decisão de falar preferencialmente para fora do Supremo."
Marco Aurélio foi um dos criadores da TV Justiça e é um dos integrantes da Corte com maior interlocução com a imprensa. A lei que criou o canal foi sancionada simbolicamente por ele, em maio de 2002, no período de sete dias em que ocupou a cadeira de presidente da República.
No STF, Marco Aurélio já teve embates com colegas. Em outubro de 2004, ele chamou o ex-ministro Joaquim Barbosa para resolver uma discussão "na rua".
No ano passado, acusou o atual presidente da Corte, Luiz Fux, de ser "autoritário", e Alexandre de Moraes de "xerife".
Com informações de Estadão Conteúdo