Publicidade
Notícias | Região PARQUES EÓLICOS

Bons ventos sopram para o setor elétrico

Com resolução de gargalos em linhas de transmissão à vista, energia eólica deve receber investimento pesado nos próximos anos no Estado

Por Ermilo Drews
Publicado em: 04.12.2021 às 05:02 Última atualização: 05.12.2021 às 15:38

Quinto Estado do País com maior potência eólica instalada, o Rio Grande do Sul pretende ampliar em mais de seis vezes a capacidade de energia gerada pelos ventos. Atualmente, este tipo de fonte é responsável por 20% da matriz elétrica gaúcha, que não é autossuficiente. Se a previsão do governo do Estado e de dirigentes do setor se confirmar, ao longo dos próximos anos isso não só poderá mudar, como o Rio Grande do Sul será exportador de energia.

Complexo Eólico de Osório foi o primeiro dos 80 parques instalados no Estado. E conta seguirá crescendo ao longo dos próximos anos
Complexo Eólico de Osório foi o primeiro dos 80 parques instalados no Estado. E conta seguirá crescendo ao longo dos próximos anos Foto: Paulo Pires/GES

Com 80 parques eólicos instalados, o Estado vislumbra a instalação de 51 novas unidades ao longo dos próximos anos, ampliando de 1,8 mil megawatts (MW) para 12 mil MW a capacidade instalada com energia eólica, conforme projeção da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema). Atualmente, toda a matriz elétrica gaúcha possui 9,5 mil megawatts de potência, o que é suficiente para abastecer cerca de 10 milhões dos mais de 11,2 milhões de gaúchos.

"Na teoria, estes novos investimentos seriam capazes de abastecer sozinhos mais do que toda a população gaúcha. Obviamente, estamos falando de uma fonte só, que é alternativa. Há momentos que não gera energia", pondera o presidente do Sindicato da Indústria de Energias Renováveis do Estado (Sindienergia-RS), Guilherme Sari.

Gargalo sendo resolvido

Pioneiro no País na geração deste tipo de energia, o setor ficou estagnado no Estado nos últimos anos por limitações no sistema de transmissão. Isso restringia a participação do Rio Grande do Sul em novos leilões de energia por dificuldades no escoamento. Com investimentos na ordem de R$ 6,5 bilhões no sistema de transmissão e a previsão de entrega de 22 das 53 obras voltadas à transmissão para ainda este ano, os bons ventos voltaram a soprar a favor da energia eólica.

"Esse era um gargalo que tínhamos, mas que aos poucos está sendo solucionado. Hoje não é mais problema, tanto que temos empresas interessadíssimas em investir em parques eólicos", argumenta o secretário estadual de Meio Ambiente e Infraestrutura, Luiz Henrique Viana.

Vento e infraestrutura

Sem este entrave, o Estado tem vento suficiente para atrair investidores. "O Brasil tem seus grandes potenciais no Nordeste e aqui no Rio Grande do Sul (confira detalhes na página ao lado), que é o início dos bons ventos do sul do continente. Principalmente toda a faixa do litoral, a Campanha e a Fronteira Oeste", detalha Sari.

Além de vento, o representante do governo do Estado cita outros aspectos que facilitam a atração de investidores, como universidades, parques tecnológicos e empresas com profissionais capacitados para produzir componentes para geração de energia renovável. Viana destaca ainda os grupos de trabalho, com técnicos da secretaria que comanda e da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), que se reúnem regularmente com representantes das empresas para acompanhar a execução dos planos de trabalho e o andamento da emissão das licenças ambientais.

"Ainda temos uma infraestrutura que facilita a logística, um nível de industrialização muito bom na indústria metalmecânica e eletroeletrônica, que são subfornecedores do setor. E linhas de financiamento para o negócio. Tudo isso e, especialmente os bons ventos, torna o ambiente propício para estes investimentos", defende Viana.

Boom do crescimento

Um dos responsáveis por instalar o primeiro parque eólico do Estado, o de Osório, o ex-secretário estadual do Planejamento Telmo Magadan é sócio da Brain Energy Energia Renováveis ao lado do engenheiro Daniel Andrade, empresa que desenvolve projetos no segmento. Magadan projeta que todo o cenário descrito por Viana irá impulsionar não só o setor, mas a economia gaúcha. "Nos próximos cinco anos vamos viver o boom da energia eólica no Estado."

Para efeito de comparação, de acordo com Magadan, apenas dobrando a potência instalada hoje, algo em torno de R$ 10 bilhões deverão ser investidos em solo gaúcho. "Num parque como o de Osório foram investidos R$ 1 bilhão. Isso muda a realidade de uma cidade", observa o especialista.

Contexto histórico

No Rio Grande do Sul, a energia eólica teve início por meio de iniciativas isoladas, nas universidades, onde foram desenvolvidos diversos estudos e pesquisas a partir da década de 1980.

Em 1999, o setor gaúcho ganhou impulso com o Programa Ventos do Sul, instituído pela Secretaria de Energia, Minas e Comunicações como política de Estado.

Em 2002, foi elaborado o Atlas Eólico, que se tornou referência no setor e serviu de ferramenta importante no desenvolvimento e planejamento dessa fonte de energia.

Em 2006, dentro do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), foi implantado o Parque Eólico de Osório, de 150 MW, o primeiro do Rio Grande do Sul, que permaneceria na posição do maior da América Latina durante vários anos.

No âmbito da política energética do Brasil, que adotou o sistema de leilões, o Rio Grande do Sul se destacou vencendo o leilão de 2009 e instalando parques em outras cidades. De lá para cá, 80 já foram instalados em solo gaúcho.

Região das lagoas é diferencial no Estado

Edilson Deitos
Coordenador do Grupo Temático de Energia e Telecomunicações do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Edilson Deitos destaca que o Rio Grande do Sul tem condições de ser um grande gerador de energia eólica tanto em projetos onshore, que são as instalações de parques eólicos em terra firme, como também projetos offshore, que são as instalações no mar e também em lagoas.

"O Estado oferece este diferencial de offshore em lagoas cujas vantagens são o baixo calado, menor salinidade da água, menos custo em obras civis e por estar mais próximo das conexões em redes de transmissão."

Deitos frisa que a região das lagoas, além da costa oceânica e da Campanha, são as mais promissoras uma vez que apresentaram ventos mais regulares, nos horários de maior demanda, e de maior intensidade quando observardos os dados de medições a 100 metros de altura. "A potência aumenta sensivelmente com instalação de torres a 150 metros de altura", acrescenta.

No entanto, ele pondera que o potencial eólico entre estas diferentes regiões pode se modificar dependendo do tipo de relevo, vegetação presente e influência exercida pelas condições climáticas.

O representante da Fiergs frisa que a conclusão e entrega das obras de redes de transmissão e subestações, conforme previsto pelo governo, são condições imprescindíveis para viabilizar a ampliação da geração eólica no Estado. "São 3,2 mil quilômetros de redes e várias subestações programadas para serem entregues proximamente. Superada esta etapa, a expectativa é de que os empreendimentos passem a ser contemplados nos leilões de energia."

"O Rio Grande do Sul é a bola da vez no setor"

Tendo atuado por dez anos como presidente da Ventos do Sul, empresa que administra o complexo eólico de Osório, Telmo Magadan é taxativo sobre o futuro do setor. "Não tenho dúvidas que os investimentos em energia renovável vão ajudar a catapultar o desenvolvimento econômico do Estado, de forma importante."

Inclusive, a atual empresa de Magadan é responsável por um dos 51 projetos sendo desenvolvidos no Estado. A Brain Energy pretende instalar aerogeradores em Tapes, ao lado da Lagoa dos Patos, num investimento bilionário, com capacidade instalada de 239,1 megawatts, suficiente para abastecer mais de um milhão de pessoas.

"Temos licença de instalação ambiental, projetos básicos e parte dos projetos executivos. Não estamos cravando uma data porque estamos na fase de estruturação de capital e modelagem societária. A Brain Energy é uma desenvolvedora. Dependemos de investidores, que estão vindo porque eles colocaram os olhos no Rio Grande do Sul", atesta Magadan.

O especialista no setor reforça que a resolução do gargalo na transmissão, aliada ao ambiente propício no Estado, tornam o Rio Grande do Sul a "bola da vez". "Não sei se todos os 51 projetos vão sair do papel, mas é certo que haverá um grande investimento, porque o Nordeste começa a ter problemas nas suas linhas de transmissão, com alguns estados quase ficando de fora de leilões", argumenta.

Para ele, o Rio Grande do Sul se alia na luta global pela redução de dióxido de carbono e do aquecimento global. "Neste momento, o mundo ainda não pode ser dar ao luxo de excluir combustível fóssil, mas é um caminho sem volta."

Fontes renováveis em crescimento

Magadan destaca que o investimento em energias renováveis é algo inevitável no contexto atual. "A meta global é zerar a emissão de dióxido de carbono até 2050. Neste contexto, a energia eólica é a fonte que mais cresce porque o vento é inesgotável e os sistemas de tecnologia dão cada vez mais precisão na produção da energia final."

Outra fonte renovável em constante crescimento é a solar, mas Magadan pondera que as características diferem da eólica. "A solar é vocacionada para ser distribuída. Ou seja, colocam painéis em cima de shopping, de casas e vai distribuindo. É uma energia segura porque se falhar num shopping não vai dar problema numa região. Mas a eólica é linkada com o Sistema Interligado Nacional (SIN). Um parque em Osório pode enviar energia para o Amazonas", difere.

Reduzir a dependência hídrica

A expansão de outras fontes é fundamental diante do esgotamento do uso da água para geração de energia. No Rio Grande do Sul, por exemplo, as hidrelétricas são responsáveis por mais da metade da energia limpa gerada aqui. No País, esta dependência é ainda maior. Por isso, quando ocorre uma crise hídrica, como acontece neste ano no Sudeste, volta a discussão sobre a possibilidade de racionamento.

"Cerca de 40% dos mananciais no País são possíveis de aproveitamento para geração de energia. Os demais estão em áreas ambientais e no Amazonas, onde não se deve mesmo permitir a construção. Só que dos 40%, devemos estar usando 37%. Está no limite. Por isso, a importância de diversificar a matriz elétrica", defende Magadan.

Energia Eólica
Energia Eólica Foto: Alan Machado/GES

Gostou desta matéria? Compartilhe!
Encontrou erro? Avise a redação.
Publicidade
Matérias relacionadas
Botão de Assistente virtual