Se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) foi alto em 2021 - o maior desde 2015 -, muito se deve aos preços da energia elétrica. De acordo com os dados oficiais do governo, a conta de luz subiu, em média, 27,34% no Brasil ao longo dos 12 meses do ano passado. O pior é que para 2022 as estimativas são de mais aumentos.
A energia elétrica foi o segundo item que mais pesou para a composição do IPCA-15 dentre todos os que são pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) - ficou atrás apenas da gasolina. Só a luz impactou em 1,20 ponto percentual dos 10,42% do índice que mede a inflação do País.
Para 2022, a previsão de melhora nos níveis das barragens não significará contas mais baixas. Pelo contrário, a energia deve até encarecer ao longo do ano.
Em outubro passado, o corpo técnico da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) calculou que o reajuste tarifário médio nas contas de luz deve ser 21,04% ao longo desse ano. O aumento seria para cobrir o rombo gerado pela crise energética de 2021. Posteriormente a própria Aneel se pronunciou informando de que essa estimativa não contabilizava as possíveis intervenções estatais para conter a escalada de preços da energia elétrica.
A TR Soluções, empresa especialista em tecnologia aplicada ao setor elétrico, porém, acredita que os movimentos do governo não devem conter totalmente a alta de preços da energia. A estimativa é de que "os consumidores de todo o País devem observar uma alta média de 13% nas contas de luz."
No Rio Grande do Sul, o peso da conta não deve ser tão grande em 2022. A partir de janeiro passou a vigorar alíquota menor do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS): indo de 30% para 25%.
"Por exemplo: quem tem uma conta de luz de R$ 100 reais, a partir de 2022 pagará 93 reais pelo mesmo consumo", calcula o subsecretário da Receita Estadual, Ricardo Neves Pereira.
O economista e professor de economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Maurício Andrade Weiss destaca que o aumento não é danoso somente às famílias que têm de pagar conta de luz mais alta. "Muitas vezes as pessoas estão pagando mais caro por bens e serviços e não fazem essa associação com a energia elétrica", ressalta.
Weiss explica que a energia elétrica mais cara também encarece a produção da indústria. Para ilustrar, ele utiliza as siderúrgicas como exemplo. "O aço feito por elas fica mais caro pela alta da eletricidade. Com isso, a indústria automobilística ou a construção civil acabam pagando mais caro para comprar esse aço. Consequentemente, os carros têm um custo maior para serem feitos e os imóveis para serem construídos. Acaba tudo no orçamento das famílias."
A partir de 2015, o governo praticamente não efetivou mais investimentos para a geração de energia elétrica. A aposta era de que eles viriam do setor privado, o que acabou não ocorrendo. Também havia a projeção de fraco avanço econômico, o que não demandaria novas e diferentes fontes de geração de energia.
Agora, em meio à situação emergencial em que o Brasil está inserido, o professor Weiss acredita que o caminho menos prejudicial seja mesmo se utilizar das termelétricas, especialmente as movidas a gás natural.
"Essa opção está bem longe de ser a ideal, mas dentro do atual cenário, as termelétricas que utilizam gás ainda têm menos custos dos que as movidas a carvão."
A maior crise hídrica desde que o nível das barragens passou a ser monitorado, há quase 92 anos, é de fato a principal responsável pela crise energética que o Brasil enfrenta. Como aproximadamente 62% da energia produzida no País é oriunda de hidreléticas seria insensato desconsiderar a relevância que as chuvas têm no sistema energético brasileiro.
O que também é impossível de ignorar é que uma série de omissões e más escolhas ao longo dos anos culminou na atual situação. Weiss explica que os investimentos em outras fontes de energia, como a eólica e a solar, foram insuficientes durante o período em que o País viveu melhor situação econômica, entre 2005 e 2013.
Notórios vilões das contas de energia elétrica, os aparelhos que lidam com temperatura, tanto para aquecer quanto para resfriar, são primordiais em vários tipos de segmentos da economia. Nas padarias, por exemplo, os fornos, expositores refrigeradores, freezers e outros utensílios ficam constantemente ligados. A consequência para poder produzir é uma conta de energia elétrica assustadora.
Proprietário de uma padaria na Avenida Doutor Maurício Cardoso, em Novo Hamburgo, o empresário Ernesto Trentin viu sua conta escalonar ao longo do ano. Em nove meses - entre março e dezembro -, o aumento foi de 33,6%. E a tendência é de que siga subindo nos próximos meses. "No verão é necessário manter o ambiente climatizado para receber os clientes. E como o ar-condicionado também consome muito, deve ficar ainda mais caro no início de 2022", acrescentou.
Ainda no último mês de 2021, o empresário teve uma pequena prévia do peso que a energia elétrica terá durante este verão. Em dezembro, a conta de luz da padaria foi de R$ 17.600,92. Esse valor foi quase R$ 4,5 mil mais alto do que o pago em março de 2021, outro mês quente do ano.
Trentin também explicou que não tem como repassar todo esse novo custo para o consumidor ante o risco de perder competitividade. "O salário de quase todos está estagnado. Se eu incluir todos os custos de produção, o cliente vai deixar de consumir", justificou.