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Notícias | Região POLÊMICA

Juíza argumenta violência policial para soltar trio preso com 151 quilos de maconha em Campo Bom

Flagrante aconteceu no fim da noite de sábado, em casa de facção, e liberdade foi concedida poucas horas depois, na tarde deste domingo

Por Silvio Milani
Publicado em: 04.09.2022 às 23:05

A juíza que soltou dois homens e uma mulher presos com 151 quilos de maconha em Campo Bom, menos de 24 horas após o flagrante, expõe os motivos dela por meio do envio da decisão oficial à reportagem na noite deste domingo (4). “Mais uma vez a atuação violenta e desmedida da polícia impede a homologação do auto de prisão em flagrante posto que violado o devido processo legal”, argumenta Priscila Gomes Palmeiro, do Núcleo de Gestão Estratégica do Sistema Prisional (Nugesp) de Porto Alegre. Ela é responsável por outras solturas polêmicas nos últimos dez dias.

Tijolos da droga e uma balança industrial foram apreendidos na noite deste sábado no bairro Celeste
Tijolos da droga e uma balança industrial foram apreendidos na noite deste sábado no bairro Celeste Foto: Brigada Militar

A Brigada Militar prendeu os homens de 23 e 22 anos, junto com a jovem de 23, quando carregavam pacotes de maconha em um Fiesta prata, por volta das 22h30 de sábado (3). Conforme a corporação, a droga era retirada de uma casa da facção Os Manos na Rua Professora Liane Rosa. Na abordagem, o rapaz de 22 anos teria colocado a mão na cintura e tentado fugir, momento em que foi baleado na perna por um brigadiano.

A juíza não só deu liberdade aos três como não homologou auto de prisão em flagrante feito na Central de Polícia de Novo Hamburgo. O alvará de soltura saiu por volta das 16 horas deste domingo, ao final da audiência de custódia. “Houve relato de irregularidade nos atos referentes à realização da prisão, sendo que (nome de um) foi alvejado na perna e (nome do outro) teria sido agredido por três policiais, sendo que dois deles fizeram a apresentação dos presos na Delegacia”, considera Priscila.

Magistrada questiona provas

Apesar da expressiva quantidade de droga apreendida, a magistrada considerou as provas frágeis. “Ademais, ressalto que neste auto de prisão em flagrante há somente a palavra dos policias, nada mais. Destaco que a palavra dos policiais não pode ganhar status jurídico de presunção legal relativa de veracidade, impondo à defesa o ônus da prova. O conteúdo de um relato, seja de quem for, deve estar ancorado em outros elementos mínimos de prova. Um processo penal composto apenas de palavras dos policiais nem de longe pode servir à qualquer decisão que se entenda fundamentada. Pelo que há nos autos, a atuação da policia iniciou por uma denúncia anônima no sentido de que a facção dos manos estaria efetuando depósito de droga em um determinado local. Ocorre que nada foi demonstrado. A mera informação de que os flagrados estavam vinculados a facção criminosa não serve.”

Priscila determina investigação dos policiais

A juíza ainda pede que os brigadianos sejam investigados: “Diante da informação de violência e irregularidades nos atos referentes à realização da prisão, determino a expedição de ofício, solicitando a apuração e adoção das providências cabíveis, com posterior informação ao juízo das medidas efetivamente adotadas, à Corregedoria da BM; à Promotoria do Controle Externo da Atividade Policial de Novo Hamburgo; ao Ministério Público Militar e ao Núcleo de Direitos Humanos da DPE”.

Ela menciona estudos e evoca direitos humanos

“O excesso doloso na atuação policial, além de constituir atentado aos direitos humanos, sobretudo quando presente visível prática de violência física, descredibiliza tudo o que decorreu da violência perpetrada, gerando custo enorme para o Estado, frustrando, sobremaneira, a persecução penal e a posterior aplicação da lei penal ao caso. Decretos claros de prisões preventivas estão sendo impedidos pela ilegalidade estatal cometida. Em várias situações, a prisão está sendo inviabilizada pela atuação da própria polícia. Quando um policial agride e tortura um preso, seja lá qual crime este tenha cometido, além de prejudicar toda atividade de persecução penal, ainda cria a necessidade de investigação por meio de procedimentos disciplinares e criminais trazendo desnecessário tumulto ao andamento processual penal. Reconhecer essas ilegalidades que decorrem da violência exercida pelo estado é uma obrigação cumprida com desgosto e tristeza.

Veja-se que a violência policial vem sendo denunciada há bastante tempo. Pesquisa realizada pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro aponta que 28% dos custodiados relataram ter sofrido agressões no momento da prisão (período compreendido entre 2018/2019). Esse número, entretanto, é muito superior e bastante significativo, uma vez que, muitos dos processos selecionados para o estudo, os custodiados não foram questionados sobre a violência, outros tantos optaram, por medo de represália, não relatar as agressões sofridas, embora visivelmente violentados, e outros, ainda, não foram apresentados à autoridade judicial."

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