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Neurodiversidade: como incluir as mais diferentes formas de se estar no mundo

Ambiente corporativo apresenta barreiras e não é amigável com profissionais que têm outra forma de se relacionar e de conviver

Reportagem: Francine Silva

A cada dia, mais pessoas se descobrem ou se afirmam como neurodiversa. No entanto, a sociedade ainda não lida de maneira natural com essas diferenças. De acordo com Luís Cerveira, coordenador do Núcleo de Estudos sobre Diversidade na Faculdade IENH, do ponto de vista da antropologia, o que hoje chamamos de neurodiversidade é uma realidade em todas as culturas do mundo, o que não significa que todas essas culturas acolham e lidam com essa neurodiversidade da mesma forma. “Nós vamos encontrar desde situações em que a neurodiversidade era considerada algo inadequado, que pudesse ser estabelecido dentro de um parâmetro da exclusão, com a ideia de alguém que precisa ser excluído do grupo; até sociedades em que essa neurodiversidade, essa visão de mundo diferente, era considerada uma espécie de bênção divina, colocando essa pessoa num patamar de superioridade, tendo inclusive funções de destaque”, lembra.

Já no caso da sociedade pós-industrial, explica Cerveira, essa pessoa era marcada por não ser suficientemente produtiva e capaz de executar as tarefas necessárias da forma e no tempo pré-estabelecido. “No Brasil, pessoas neurodiversas eram escondidas pela família ou se tornavam figuras bastante caricatas, tratadas como loucas e fora do sistema produtivo. Muitas vezes, inclusive, vistas como perigosas, indesejáveis pela família e pela sociedade, e acabavam em instituições como sanatórios, com várias histórias de tragédias, até mesmo com torturas como suposto tratamento”, relata.

Mesmo com o passar dos anos, falar de neurodiversidade ainda é, por vezes, um tabu. “No mundo corporativo, é uma das demandas que vem se falando recentemente. Mas as experiências ainda são muito novas, têm poucos estudos sobre o tema. O ambiente das empresas, tradicionalmente, não é amigável às diferenças que não se possam enquadrar naquele padrão de metas e prazos”, observa. 

Prêmio Inclusão e Diversidade

Prêmio Inclusão e Diversidade for business

As inscrições para a primeira edição do Prêmio Inclusão e Diversidade for business estão abertas. Até dia 7 de julho, as empresas podem submeter suas ações para a análise dos jurados. Promovido pelo Grupo Sinos, a premiação vai reconhecer as boas práticas na promoção da inclusão e da diversidade no ambiente corporativo. Ao todo, são seis categorias contempladas nesta primeira edição: Inclusão PCD; Programa de Comunicação Interna para Promoção da Diversidade; Mulheres na Liderança; Ação Afirmativa Raça e Etnia; Multi-gerações; e o Melhor Programa Global de Promoção da Diversidade. O prêmio conta com o apoio da Universidade Feevale e Prefeitura de Novo Hamburgo. Conta ainda com apoio institucional da Associação Comercial, Industrial e de Serviços (ACI-NH/CB/EV/DI); Associação Comercial, Industrial, de Serviços e Tecnologia de São Leopoldo (Acist-SL); Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal); e Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados).

 

"O defeito não está na pessoa. O mundo que é hostil e excludente"

ENTREVISTA| Ricardo Lugon Arantes, professor de Medicina da Universidade Feevale

O que é a neurodiversidade?
Vai falar a respeito de outro modo de habitar o mundo, de se relacionar com as pessoas e de experimentar sensações e cognições sobre as relações sociais.

Existe um aumento no número de casos de pessoas divergentes? Ou isso é resultado do avanço da medicina no diagnóstico?
Muitas pessoas estão se reconhecendo e se afirmando dentro da neurodivergência. Não é uma coisa que depende exclusivamente do diagnóstico médico. Depende da pessoa encontrar redes de pessoas neurodivergentes e que ofereçam pra ela pertencimento. Como a causa da neurodiversidade tem tido maior visibilidade, as pessoas passam a se reconhecer e se afirmar, dependendo ou não de um diagnóstico médico.

Como você vê essa questão?
Um dos pontos interessantes dessa conversa é que, na perspectiva da neurodiversidade, você tira a percepção da pessoa. Não é porque a pessoa é autista e tem tal e tal sintoma. Não é isso. É a sociedade , o mundo é hostil às pessoas divergentes. Em que sentido, por exemplo? Às vezes os restaurantes têm muito ruídos. Às vezes as pessoas se relacionam supondo certas coisas e isso produz constrangimento, produz hiperestimulação, muito sofrimento. O defeito não está na pessoa e, sim, no mundo, na sociedade, os contextos reproduzem modos hostis e excludentes às pessoas neurodivergentes.

Quais os principais entraves para uma pessoa diversa?
A gente vai ter uma série de barreiras. Barreiras no ensino fundamental. E às vezes essa barreira vem como “não posso construir nenhuma adaptação se não tenho o laudo médico”. `No ensino superior, tem uma série de barreiras que pressupõe que o aprendizado formal acadêmico é a única maneira.

Como o mercado de trabalho pode colocar em prática a neurodiversidade?
O mercado de trabalho precisa repensar a sua relação com o que a gente chama de produtividade. Isso é um ponto importante pra gente ter uma sociedade inclusiva. As empresas que querem se apresentar como inclusivas precisam redesenhar o que chamam de produtividade. Essa pressão, dentro de uma determinada lógica, produz sofrimento e demissões precoces. Isso vai demandar que as equipes de RH conheçam as pessoas que se afirmam neurodivergente, produzir contextos de trabalho e relações de trabalho acolhedoras, respeitosas e que levem em considerações os impedimentos corporais e o que a empresa reproduz de lógica massificante sem se dar conta.

Como fazer com que a neurodiversidade não seja só um discurso, mas seja colocada em prática?
A resposta seria enorme. Mas eu dou algumas pistas: não colando neurodiversidade em diagnóstico médico; reconhecendo e afirmando que há uma série de outras possibilidades de estar no mundo, de se relacionar, de ouvir, de construir cognições de como os outros pensam; prestar atenção em coisas básicas que a gente reproduz sem se dar conta. Outra forma é estar muito atento para não entrar no discurso da tragédia ou da vítima. De que o autismo, por exemplo, seria uma tragédia pessoal. Ou de consertar, de corrigir, como estimulação precoce para diminuir o autismo. Isso é violento, pois se pressupõe que esse modo de existência é indesejado ou que a gente quer abolir ele do mundo. Construir uma sociedade que repensa e se torna cada vez mais inclusiva, redesenhando as suas formas de se relacionar.

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