João Pedro Mattos Pinto. Brasileiro. Idade: 14 anos. Pobre. Negro. Morador do Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro, assassinado com tiro de fuzil na noite de segunda-feira durante operação da Polícia Militar. A família do menino, que brincava com os primos no momento de sua execução, não teve notícias do seu paradeiro até a manhã desta terça-feira, quando soube do paradeiro do corpo. O garoto foi levado de helicóptero e apareceu a dezenas de quilômetros de distância.
O jovem de 14 anos é mais um numa longa lista de crianças e adolescentes executados pela Polícia Militar do Rio de Janeiro. Em 2020, segundo dados do Fogo Cruzado RJ, já foram 24 adolescentes baleados na Grande Rio, sendo que 11 morreram. O assassinato de João ocorreu horas depois de o jornal New York Times ter publicado uma matéria de capa mostrando o ano recorde de mortes pela Polícia carioca, a que mais mata em todo o mundo.
“É uma casa bonita com piscina e policiais acreditam se tratar de esconderijo de traficantes. Pobre não pode conquistar coisa boa?”, indagou a tia do menino. Por que negros e pobres morrem sistematicamente no Brasil? Se João Pedro tivesse sido morto enquanto brincava com seus primos numa cobertura da Barra da Tijuca, a comoção que se veria no meio político e na mídia seria imensamente maior, mas João era da periferia de São Gonçalo. Ser negro e ser pobre selaram o seu destino.
O vírus que mata milhares de brasileiros na epidemia é o mesmo que matou João. O descaso com o pobre neste País. João perdeu a vida enquanto no Congresso Nacional se discute criar um novo Tribunal Federal que inchará ainda mais a máquina de altíssimos salários do Judiciário. João perdeu a vida em um País que gastou bilhões em estádios de futebol que hoje são “elefantes brancos”, mas que serviram para irrigar os esquemas de corrupção. João perdeu a vida em um Brasil que, historicamente, virou as costas para o SUS e cuja tragédia de descaso leva hoje a hospitais colapsados, falta de médicos e enfermeiros, escassez de insumos e equipamentos de proteção individual, que custam vidas. Não por acaso quem mais está morrendo na epidemia são pobres.
O Brasil é um País em que a vida de pobre vale pouco. Se negro, então, muito menos em terra de racismo sistêmico. Vivemos numa era de odiosa necropolítica em que “fazer arminha” e saudar ações policiais assassinas se tornaram bandeira eleitoral. A maioria dos policiais não é corrupta, mas há como em qualquer profissão os seus elementos podres. E, em se tratando de quem tem um fuzil na mão, quem é podre não somente se corrompe como mata inocentes.
Os vírus vão matar muito mais. O corona e o do descaso. E as estatísticas macabras apenas serão a cada dia engordadas por histórias que se perdem, sonhos que acabam e famílias que se destroçam enquanto os
detentores do poder trabalham para proteger interesses de corporações e promover seus objetivos eleitorais.
Esse Brasil me enoja!