DÉBORA ERTEL
Para proteger, preservar e principalmente frear as ocupações irregulares dos contrafortes do Ferrabraz o Ministério Público Estadual (MP) firmou termo de ajustamento de conduta (TAC) com as prefeituras de Araricá, Nova Hartz e Sapiranga. Segundo o promotor do MP de Sapiranga, Michael Schneider Flach, o principal problema é a falta de fiscalização que não conseguiu controlar o crescimento desenfreado das chacrinhas. "Estamos mapeando a região há dez anos e existem muitas construções irregularidades, tanto consolidadas como em curso", salienta Flach. Segundo o Núcleo Sócio Ambiental Araçá-piranga os três municípios juntos têm o total de 10,4 mil hectares de Mata Atlântica, sendo que Sapiranga tem a maior área, 6.836 hectares, Nova Hartz com 2.989 e 575 hectares em Araricá.
Para defender esse patrimônio natural, dentre as cláusulas comuns que os três municípios devem cumprir estão a criação de equipes efetivas de fiscalização e a obrigação de firmar convênio com entidades ligadas à preservação ambiental. Também está prevista a derrubada de edificações ilegais localizadas dentro da área protegida.
Leis protetivas
As prefeituras também devem garantir ainda que os conselhos municipais de Meio Ambiente e Urbano funcionem. Em relação às cidades de Araricá e Nova Hartz, o promotor do MP de Sapiranga, Michael Schneider Flach, determinou ainda que até o final de 2019 os Executivos elaborem leis que protejam o Ferrabraz. A multa para o descumprimento das medidas do TAC pode chegar R$ 100 mil.
Os contrafortes do Ferrabraz pertencem a uma das áreas de Mata Atlântica mais bem conservadas do Rio Grande do Sul. Na região existem 192 espécies de árvores, 133 espécies de aves e 58 espécies de mamíferos, muitas delas ameaçadas de extinção.
Sendo assim, o MP destaca que o bioma da Mata Atlântica é patrimônio nacional e o meio Ambiente ecologicamente equilibrado é bem de uso comum, essencial à qualidade de vida da população.
Em fevereiro de 2018, a Arie Ferrabraz foi inserida no Sistema Estadual de Unidades de Conservação do Rio Grande do Sul (Seuc), tornando-se uma unidade de conservação. Desta maneira, a prefeitura assumiu o compromisso de implantar um plano de manejo para área. No entanto, na avaliação da Promotoria de Sapiranga, as ações de preservação da região permanecem apenas no papel. “Precisa colocar em prática o que existe desde 2016. É necessário dar eficácia para essa lei”, cobra o promotor Flach (foto). O TAC foi registrado no inquérito civil que tramitava há uma década e buscava investigar e combater o desmatamento em local de preservação permanente. Assinaram o documento, além do promotor, a prefeita Corinha Molling e a procuradora do município, Miriam Monteiro.
Em seis meses, deve ser elaborar o Plano de Manejo da Área de Relevante Interesse Ecológico do Morro Ferrabraz
Obrigação de realizar fiscalização periódica no Ferrabraz, adotando as medidas administrativa e/ou judiciais cabíveis em caso de intervenção humana não autorizada, fora dos limites autorizados ou de qualquer outra forma irregular, devendo impedir qualquer construção indevida no local.
No prazo de seis meses deve ser criada uma equipe de fiscalização permanente multidisciplinar, formada por técnicos do Departamento de Meio Ambiente, com cronograma de atuação semestral previamente estabelecido.
A prefeitura assume a obrigação de aplicar recursos e realizar ações concretas em favor da preservação, da fiscalização e promoção do Ferrabraz no valor de R$ 50 mil, a serem aplicados em materiais ou em repasse para o Fundo Municipal de Meio Ambiente. A determinação deve ser cumprida em oito meses, podendo os valores serem incluídos no orçamento de 2020, independente de outros recursos.
As prefeituras assumem a obrigação de elaborar e fazer aprovar, junto à Câmara Municipal, legislação que instituiu área de relevante interesse ecológico (Arie) junto ao Morro Ferrabraz até dia 31 de dezembro de 2019.
Obrigação de realizar fiscalização periódica no Ferrabraz, adotando as medidas administrativa e/ou judiciais cabíveis em caso de intervenção humana não autorizada, fora dos limites autorizados ou de qualquer outra forma irregular, devendo impedir qualquer construção indevida no local.
Em locais onde ocorreu desmatamento deve ser realizada a recomposição da vegetação perdida. As medidas administrativas deverão ser adotadas no prazo de 60 dias, enquanto que as medidas judiciais deverão ser propostas no prazo de 120 dias.
Araricá deverá, em 120 dias, realizar concurso para Fiscal de Meio Ambiente e criar uma equipe de fiscalização permanente multidisciplinar, com cronograma de atuação semestral previamente estabelecido. Já a prefeitura de Nova Hartz, tem o prazo de 60 dias para criar a equipe de fiscalização.
Ficam estabelecidas as seguintes multas:
a) valor de R$ 10 mil pelo descumprimento de qualquer cláusula do TAC;
b) mais R$ 1 mil por evento não autorizado, irregular ou além dos limites legais;
c) mais R$ 100 por dia de atraso, para eventual descumprimento injustificado das obrigações de fazer;
d) R$100 mil pela não adoção das medidas administrativas ou judiciais cabíveis.
Em maio do ano passado o Jornal NH publicou a série de quatro reportagens "Ferrabraz: um tesouro da biodiversidade", apresentando o desafio que Sapiranga tinha pela frente para harmonizar a preservação ambiental ao turismo, à agricultura e a memória histórica da região. Em mais de um ano, o plano de manejo, principal ferramenta para determinar quais são as atividades permitidas no Ferrabraz, assim como as zonas que podem ser ocupadas, aquelas que devem ser preservadas e quais espaços necessitam de recuperação, não avançou. Conforme o prazo estipulado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) na época, a prefeitura tinha cinco anos para elaborar o documento. De acordo com a diretora de Meio Ambiente, Bruna de Oliveira Boeni Fonseca, dentro do planejamento para elaboração do plano estão sendo tomadas as medidas para delimitação da área com instalação de marcos físicos.
Segundo prefeitura, através de sua assessoria de imprensa, também ainda não houve captação de recursos para a unidade de conservação. Foi solicitado apoio técnico e de recursos para a Sema, ainda sem retorno até o momento.
Em relação à regularização dos imóveis rurais dentro da área do Ferrabraz, a assessoria informa que para frear a ocupação irregular de imóveis menores a dois hectares, o que é permitido em lei, o Conselho do Plano Diretor está elaborando uma lei específica para a zona rural. Nesta legislação será determinado como fica a situação dos imóveis rurais no município de Sapiranga.
Com uma biodiversidade significativa da Mata Atlântica, o Ferrabraz abriga 58 espécies de mamíferos, 133 espécies de aves e 191 espécies de árvores. Com 774 metros de altura e um índice pluviométrico anual de 2.240 milímetros, a área é um grande reservatório de água da bacia hidrográfica do Rio dos Sinos, além do ponto mais alto da região.
As 135 espécies de aves estão distribuídas em 35 famílias. Isso representa 22% das espécies descritas para o Estado. Sete espécies presentes no Ferrabraz estão na lista de vulneráveis e ameaçadas. Já das 58 espécies de mamíferos, dez delas ameaçadas e vulneráveis. Em relação às 191 espécies arbóreas, elas são pertencentes a 132 gêneros e 57 famílias, o que
representa 37% da diversidade encontrada no Rio Grande do Sul, que tinha catalogado 519 espécies. Das presentes no Ferrabraz, 22 estão ameaçadas.
ARIE de Sapiranga
Em Sapiranga a unidade de conservação tem 5.761 hectares, distribuídos pelos distritos do Morro Ferrabraz, Picada São Jacó, Picada Verão, Picada Schneider, Bela-Hú, AltoFerrabraz, Picada Cachorro e Fazenda Padre Eterno. Nesteregião, vivem aproximadamente 180 pessoas.
Estima-se que existam pelo menos 19 quedas d’água significativas. São três no Arroio Lauer (São Jacó). Em BelaHú, no Arroio dos Fleck, quatro, e 12 no Arroio Feitoria. Aquantidade de cascatas é justificada pela altitude dos contrafortes, a drenagem e a formação basáltica.
Com a criação das Aries de Nova Hartz e Araricá, que, conforme o MP, precisam ser concluídas até o final deste ano, haverá uma proteção legal de um corredor ecológico entre as três cidades. Os corredores ecológicos são áreas que unem os trechos de florestas ou unidades de conservação separados por interferência humana, como por exemplo, estradas, agricultura, atividade madeireira. O objetivo do corredor ecológico é permitir o livre deslocamento de animais, a dispersão de sementes e o aumento da cobertura vegetal. Esse trânsito da vida silvestre permite a recolonização de áreas degradadas, em um movimento que, de uma só vez, concilia a conservação da biodiversidade e o desenvolvimento ambiental na região.
O corredor ecológico explica, por exemplo, a aparição do gato mourisco em uma propriedade de Picada Café na semana passada.