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Notícias | Região Falta de chuva

Estiagem traz à tona necessidade de se cuidar melhor do Rio dos Sinos

Com o Sinos no menor nível das últimas décadas, série de preocupações surgem e necessidade de ações para mitigar efeitos da estiagem voltam à pauta. Mas faltam recursos e prioridade

Por Ermilo Drews
Publicado em: 07.05.2020 às 07:00 Última atualização: 07.05.2020 às 10:10

Prainha, Rio dos Sinos, Novo Hamburgo, 29 de abrilde 2020 Foto: Ermilo Drews/GES-Especial
Nunca vi o rio tão baixo. Não importa o ponto do Rio dos Sinos que se para, esta costuma ser a frase de apresentação dita por quem está por perto. E o senso comum tem razão de ser. Ao menos desde 1998, o Sinos nunca atingiu nível tão baixo em Novo Hamburgo. Desde esta época, a Comusa Serviços de Água e Esgoto, que distribui a água na cidade, faz a medição regular do nível. De lá para cá, a profundidade mais baixa no ponto de captação foi 1,96 metro. Isso até este ano. No feriado do dia 1º, chegou a 1,73 metro. A chuva fraca desta semana elevou em poucos centímetros o nível. Ainda assim, está mais de um metro abaixo do normal no ponto observado pela Comusa.

A falta de chuva provoca situação semelhante em toda a Bacia do Rio dos Sinos e em outros cursos d'água do Estado. Quase 70% dos municípios gaúchos já decretaram situação de emergência por causa da estiagem. Em alguns pontos do Sinos, a água recuou dez metros, sobrando margem e lixo. Um destes locais é a chamada Prainha, no limite dos bairros Santo Afonso e Lomba Grande. "Dá uma pena. Os peixinhos ficam pulando com pouca água", lamenta Terezinha Mees, 59 anos, que há quase cinco mora nas imediações.

No caso das cidades que dependem da Bacia do Sinos, especialistas dizem que só não falta água na torneira de muita gente pelo investimento feito pelas operadoras na captação e tratamento de água ao longo dos últimos anos e pela gestão da vazão entre os órgãos competentes. O problema é que não chove em volumes expressivos há cinco meses. É muito tempo. E o prognóstico do governo do Estado é que a chuva prevista para os próximos três meses não seja tão significativa que compense tanto tempo de estiagem. Ou seja, vai demorar para a situação voltar ao normal.

Enquanto isso, o pedido das concessionárias de distribuição de água e órgãos que zelam pelo Sinos é que todos utilizem a água de forma racional. "A diminuição da vazão do Rio dos Sinos vem sendo percebida há meses. A racionalização do consumo da água por parte da população passou de uma medida de bom senso para uma necessidade imperiosa. No início de março, percebeu-se que o nível do rio aproximava-se perigosamente dos limites de captação para o abastecimento da população. Mas a situação não estava tão crítica como agora", alerta Hener de Souza Nunes Júnior, diretor técnico do Pró-Sinos. "O racionamento da água ainda não foi adotado, mas em um cenário de escassez crescente não pode ser desconsiderado", opina.

Redução da vazão concentra mais a poluição

Criado para trabalhar pela recuperação ambiental da Bacia do Sinos, após a mortandade de 1 milhão de peixes em 2006, o Pró-Sinos sabe que se a estiagem perdurar, diversas espécies estarão ameaçadas naquele que é considerado o quarto rio mais poluído do País. "A diminuição da vazão dilui menos a carga de esgoto, comprometendo a qualidade da água. A carga de poluentes sofreu pouca redução no período de estiagem porque hábitos de consumo pouco mudaram, e a geração de esgoto é diretamente influenciada pelo consumo de água", observa.

Com o isolamento motivado pela Covid-19, ele admite que houve uma redução nas atividades comerciais e industriais, mas nos domicílios o consumo aumentou, equilibrando o lançamento de poluentes. "A maior concentração deles, principalmente matéria orgânica, e as temperaturas altas ainda favorecem o desenvolvimento de bactérias que elevam muito o consumo do oxigênio dissolvido e o risco de morte de grande quantidade de peixes", adverte.

Outro problema é a elevada concentração de minerais como ferro e manganês, difíceis de eliminar no processo de tratamento e que, em contato com o cloro, produzem turbidez, cheiro e odor. "As concessionárias necessitam realizar um trabalho muito maior para manter a qualidade da água distribuída à população. Ainda têm conseguido, embora, eventualmente, surjam reclamações", admite o diretor técnico do Pró-Sinos, ponderando que as operadoras atestam que as substâncias mencionadas não são tóxicas nas concentrações encontradas na água tratada.

Saneamento básico não tem sido prioridade

O Pró-Sinos tem atuado para desenvolver e fortalecer ações voltadas à educação ambiental e mobilização social para o uso racional da água. No entanto, o diretor técnico do consórcio reforça o coro de que estiagens regulares não são resolvidas apenas quando aparecem. "No horizonte menos imediato, temos trabalhado para que os municípios atualizem e instituam seus planos de saneamento básico. Também nesses planos se definem as medidas de enfrentamento de emergências e contingências", defende Nunes Júnior. No entanto, o desenvolvimento e aplicação destes planos vêm sendo adiados. "Falta priorização do saneamento básico nas políticas públicas", admite.

Estudo de vazão pode ter licitação em 2020

Presidente do Comitesinos, Anderson Etter lembra que assim como a enchente, a seca é um fenômeno natural. Não pode ser controlado. No entanto, seus efeitos podem ser remediados. E é aí que entra o Plano da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, elaborado em 2014 pelo colegiado com atribuição legal para o gerenciamento dos recursos hídricos. Uma das medidas sugeridas no plano é considerada prioridade: o estudo de regularização de vazão da bacia. "Ele possibilitará aumentar a disponibilidade de água, mantendo e/ou criando as melhores condições para que, quando a natureza resolver agir, ofertando as chuvas tão necessárias, as águas possam ocupar seus espaços originais como as áreas úmidas ou banhados", explica Etter.

"O estudo será imprescindível na medida que considera a bacia como um todo, pois as correções artificiais ou emergenciais, sem o devido planejamento, serão paliativos que tendem a interferir no curso e na vazão da água em outros pontos do rio", alerta. Desde 2016, o Comitesinos cobra a realização do estudo ao governo do Estado, que argumenta falta de recursos para não fazer avançar a proposta. No entanto, de acordo com o Departamento de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS) da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura, a licitação para a execução da proposta deve acontecer até o fim do ano.

Comitesinos atesta uso racional da água

Etter atesta que o uso racional da água tem sido praticado por setores produtivos da bacia do Sinos, como indústrias, operadoras de abastecimento público e agricultores, de modo a reduzir perdas e desperdícios. "Há múltiplos esforços. Uma bacia precisa ter água suficiente para atender todas as demandas de quem tem outorga para retirar água do rio e manter o balanço hídrico, incluindo reserva técnica para manutenção da vida aquática., explica o presidente do Comitesinos. "O fundamental é pensar em alternativas estruturantes para reservação, especialmente para os períodos de escassez."

Conservação de banhados é importante

Uma das iniciativas que já contribui para minimizar os efeitos da estiagem é o mapeamento dos banhados na várzea do Sinos, que define os espaços que não podem ser ocupados, em iniciativa do Comitesinos. "Os banhados são ambientes de solo encharcado, formados pela água das chuvas, rios e lagos ou ainda por águas subterrâneas. Eles têm a função de controlar as enchentes, absorvendo a água nos períodos de cheia, e de amenizar a estiagem, lançando a água no rio quando necessita."

Comusa alertou para colapso no ano passado

Em outubro do ano passado, a Comusa - Serviços de Água e Esgoto de Novo Hamburgo levou novamente à pauta do Comitesinos a necessidade da criação de reservatórios para armazenamento de água na bacia. "Se voltarmos a enfrentar um longo período de estiagem, poderemos colocar toda a bacia à beira de um colapso", alertou, na época, o então diretor-geral, Márcio Lüders. No caso do estudo de vazão, ele cobra agilidade. "O plano foi apresentado em 2014 para que o estudo fosse feito em até quatro anos, mas, até agora, não foi feito", diz Lüders, que deixou nesta semana o comando da Comusa, mas segue à frente do Conselho Deliberativo.

A instalação de empreendimentos clandestinos ao longo da bacia, sem o devido cumprimento da lei, é outro problema apontado pela operadora. Lüders afirma que a Comusa tem feito a lição de casa. Além de investimento que permite captar água em níveis mais baixo, a distribuidora diminuiu em 15% o índice que mede o desperdício de água, com reduções de vazamentos, problemas com hidrômetros, rompimentos em tubulações antigas, nível de poluição do rio, ligações irregulares, entre outros fatores. Apesar da perda ainda chegar a 36,30%, é mais baixa que a média nacional e da região Sul.

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