Mãe de jovem com doença rara sofre golpe do remédio em Estância Velha

Portador de fibrose cística, Marcelo Silveira Muller, 25 anos, está debilitado em casa, no bairro Bela Vista, em Estância Velha. Precisa tomar medicação que custa R$ 25 mil por mês para estacionar a doença até o sonho do transplante pulmonar. A família é de baixa renda. O pai, Marcio, 46, sustenta a casa como motorista de caminhão. A mãe, Rosângela, 43, não trabalha porque precisa cuidar de Marcelo. O casal tem mais três filhos, todos menores. Ao pedir ajuda nas redes sociais para compra dos remédios, ela caiu em golpe nesta semana. Nesta quinta-feira (3), ela procurou a Polícia.

"Chorei de felicidade quando recebi o contato de doação e depois de tristeza ao ser avisada, por amigos, que fizeram maldade com a gente. O mundo desabou", desabafa Rosângela. Ela foi rastreada pela quadrilha ao pedir ajuda para o filho nas redes sociais. Enquanto aguarda decisão judicial para custeamento público do tratamento de Marcelo, ela criou uma "vaquinha on-line" e publicou no Facebook. Amigos e parentes compartilharam.

Na segunda-feira (31) pela manhã, Rosângela recebeu contato afetuoso de uma suposta moradora de Holambra, no interior de São Paulo. Apresentou-se como Marilene. A mulher dizia que uma sobrinha tinha três caixas de Trixacar para doar porque um parente que usava morreu. "Parecia um milagre. Tinha rezado muito. Lamentei a ela pela pessoa que faleceu e comecei a conversar com essa senhora pelo Face, que depois passou o WhatsApp."

O bote

No início da noite, a sobrinha mencionada chamou Rosângela no celular. Também por meio de mensagens fraternais, com fotos da medicação, ela se dizia disposta a enviar, com o porém de que a moradora de Estância precisava custear as despesas da remessa. Usava o nome de Regiane, de Araçatuba, também interior paulista. "Fiquei tão feliz. Logo aceitei. Era uma graça de Deus. Nem tinha o dinheiro dos Correios, tanto que pedi emprestado para uma vizinha." A até então generosa mulher chegou a enviar guia de sedex, que totalizava 321 reais. "Paguei e enviei o comprovante do Pix." 

Quadrilha tenta lesar outras famílias

Rosângela conta que a quadrilha vem tentando fazer mais vítimas após publicação de pedido de ajuda pelas redes sociais. "Foram atrás de outras mães, mas só eu caí. Quando me falaram que também receberam contato de golpistas, mandei de novo mensagem para essa pessoa que me enviaria os medicamentos e ela respondeu que não conseguiu por causa dos protestos."

A dona de casa relata que foi ao banco, na tentativa de rastrear o dinheiro. "Disseram que não podiam fazer nada, porque é Pix, mas contaram que a conta é bem suspeita. Nela entram vários Pix todos os dias, e o titular transfere para outra." Ela frisa que o abalo do golpe não fará desistir do tratamento do filho. "É muita maldade o que fizeram com a gente, brincando com a vida do meu filho. E esse dinheiro que perdemos é muito para nós. A gente está juntando tudo o que pode."

Fila de transplante e ação judicial

Segundo Rosângela, o filho deve entrar em janeiro na fila de transplante. "Uma advogada ingressou com processo na Justiça para conseguirmos o tratamento pelo governo. Estamos muito preocupados com o agravamento da doença. Do ano passado para cá, o Marcelo vem ficando mais seguidamente hospitalizado. O médico falou que, se continuar assim, terá poucas chances. Tem 25 anos e pesa 40 quilos."

Ela lembra que a fibrose cística foi diagnosticada quando bebê, pelo teste do pezinho. Só conseguiu estudar até a quinta série. "Meu filho tem retardo mental também. Precisa de outros seis medicamentos, que vem tomando."

Conforme Rosângela, o jovem nunca foi tratado com Trixacar porque a família não tem como comprar. "Uma caixa custa R$ 25 mil. Cada uma dura um mês. São 90 comprimidos, e ele precisa de três ao dia."

'Passaram dos limites', declara delegado

O delegado de Estância Velha, Rafael Sauthier, afirma que deu início à investigação assim que a mãe do paciente registrou ocorrência, na manhã desta quinta-feira. "Seria apenas mais um golpe se não fosse a situação utilizada pelos criminosos. A grande maioria é aplicada contra pessoas pobres, que acabam perdendo dinheiro que muitas vezes economizaram com muito sacrifício durante uma vida inteira. Exploram situações de fragilidade. Nesse caso, os golpistas passaram dos limites ao se utilizarem da doença rara de um filho para prejudicar uma família que atravessa dificuldades financeiras decorrentes de um tratamento de saúde muito caro." Segundo ele, há um esforço para rastrear a conta bancária e outras informações passadas pelos golpistas na tentativa de identificá-los.