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Notícias | Região Finanças

Com menos dinheiro nos cofres públicos, prefeitos da região projetam dificuldades nos próximos meses

Cidades terão de fazer ajustes nas contas públicas para evitar cortes em áreas prioritárias

Por João Victor Torres
Publicado em: 28.04.2020 às 05:00 Última atualização: 28.04.2020 às 07:31

No município de Dois Irmãos, uma estrutura foi montada para atendimento de pacientes Foto: Divulgação/Prefeitura de Dois Irmãos

Ainda não é possível estimar quanto, mas a queda na arrecadação de Estados e municípios é uma realidade a ser enfrentada por governadores e prefeitos. Os cálculos para fechar esta dura equação são feitos quase que diariamente. Quem comanda Estados e municípios tem, além da Covid-19, o rombo no orçamento para administrar logo ali na frente. 

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Em Novo Hamburgo, as projeções indicam para uma diminuição de 30% a 40%. Isto levando em considerando o cenário atual. O orçamento previa pouco mais de R$ 1 bilhão de receita para o Município, sem contar a administração indireta.

Neste cenário, a Prefeitura pode perder entre R$ 300 milhões e R$ 400 milhões. "O Município ainda está avaliando os impactos, mas segundo estimativas do governo estadual e federal, a arrecadação pode cair entre 30% a 40%", avalia o secretário municipal da Fazenda, Betinho dos Reis. "Assim como o Orçamento não é uma peça exata, a projeção também não é", pondera.

Com menos dinheiro entrando nos cofres públicos, gestores terão de fazer ajustes nos orçamentos em meio à pandemia. A missão ganha contornos dramáticos por envolver diretamente um setor prioritário, ainda mais agora, como é a saúde. Além dele, em linhas gerais, lideranças da região descartam cortar dinheiro da educação e da área social, especialmente considerando que o "pós-coronavírus" deve ser turbulento.

Até aqui, uma significativa parcela das cidades precisaram investir na aquisição de equipamentos de proteção individual (EPIs) para profissionais de saúde, álcool gel, respiradores e estruturas de atendimento à população. Por consequência da ampliação de espaços, alguns municípios também precisaram contratar médicos de forma temporária para suprir esta nova demanda. Em paralelo, ações de desinfecção de espaços públicos também passaram a fazer parte da rotina das prefeituras.

No meio desse fogo cruzado, prefeitos precisam driblar o aumento exponencial dos EPIs. É bom lembrar que uma parcela significativa dos produtos está em falta no mercado e os ainda disponíveis inflacionaram. Como os recursos dos municípios são finitos e a queda na arrecadação já é sentida, quem deverá pagar o pato são áreas como turismo, cultura e desporto. Obras consideradas não essenciais podem ficar para depois.

Cenário de escassez

A prefeita de Dois Irmãos e presidente da Associação dos Municípios do Vale do Rio dos Sinos (Amvars), Tânia Terezinha da Silva, destaca que as 12 cidades pertencentes ao bloco não se reuniram para discutir as finanças.

Os líderes regionais estão concentrados nas ações de combate ao vírus, mas não esconde que o assunto preocupa. "Ainda não sentamos para tratar dessa questão em específico, porém, será cada vez mais difícil administrar esta balança", prevê.

No Rio Grande do Sul, em abril, as perdas devem ultrapassar R$ 700 milhões. "A emissão de notas fiscais eletrônicas teve uma redução média de 17,1%, no acumulado desde o dia 16 de março até 10 de abril", pontua o secretário estadual da Fazenda, Marco Aurélio Cardoso.

Também foi possível mapear quais setores foram mais atingidos até aqui. "O varejo tem tido uma redução maior de vendas, com queda acumulada de 28,0%, seguido pela indústria (-23,2%) e pelo atacado (-10,1%)", complementa.

Quando devem vir os números

Conforme o economista e professor da Universidade Feevale, José Antônio Ribeiro de Moura, a partir do mês que vem é que os gestores deverão sentir com maior força o recuo nas previsões orçamentárias estimadas para 2020.

"Entendo que já no próximo mês a arrecadação deva cair, refletindo a queda da atividade econômica nos meses de março e abril e a retomada somente no segundo semestre", sinaliza.

Já em relação ao tamanho da crise, considera que ela está diretamente ligada à capacidade do atendimento disponível na rede de saúde. "Quanto maior o ciclo do isolamento, que considero correto para evitar um colapso na saúde, maior será o período da retomada", reforça.

Solidariedade e alívio no caixa

Campo Bom desembolsou R$ 364,4 mil até aqui no enfrentamento à pandemia. A prefeitura adquiriu mil testes para Covid-19, dois ventiladores pulmonares, 30 termômetros infravermelho e equipamentos de proteção individual dos mais variados.

Entre eles máscaras, aventais cirúrgicos, óculos de proteção, luvas e TNT para confecção de parte desses itens. Além disso, estão nesse cálculo, os dois aditivos para contratação de médicos.

Conforme o prefeito Luciano Orsi, a solidariedade teve um peso importante para auxiliar a reduzir o volume de compras feitas por parte do Executivo campo-bonense.

"Ganhamos muitas doações das empresas, como respiradores e demais EPIs. Para se ter uma ideia, uma caixa com 50 máscaras descartáveis custava 7 reais. Agora, na pandemia, há empresas cobrando em torno de 150 reais pela mesma quantidade", observa.

 

Quem pode pagar o pato

Dois Irmãos destinou R$ 250 mil no combate à pandemia. Deste montante, R$ 80 mil foram de recursos próprios e o restante de valores vieram do Tribunal de Justiça, governo do Estado e União.

A cidade é uma das mais atingidas em relação as demissões no setor calçadista, o que traz grande preocupação à prefeita Tânia Terezinha da Silva, que defendia a retomada gradual da atividade comercial.

"Nossa indústria e o comércio são dois setores que sofrendo muito, pois não há pedidos sendo feitos, com as vendas impossibilitadas", sublinha.

Como as aglomerações estão suspensas por tempo indeterminado, atividades relacionadas ao turismo, desporto e cultura não devem ocorrer tão cedo. E é daí que deve vir o fôlego no caixa do município para suprir a escassez de recursos. A prefeitura deve escalonar o orçamento para reposicionar valores e utilizá-los em outras áreas.

Orsi adianta que contratos serão revistos em Campo Bom e investimentos devem ser reavaliados. "Precisaremos fazer ajustes. Não vamos cortar serviços essenciais como saúde, educação e social. Talvez investimentos em melhorias não essenciais, como as obras no Parcão, fiquem para depois", complementa.

O espaço, que é um dos mais frequentados pelos campo-bonenses, ganharia incrementos. A prefeitura aplicaria R$ 5,2 milhões do Tesouro municipal para ampliar o local. Só que, com a pandemia as intervenções terão de esperar.

Linha semelhante é adotada por Joel Wilhelm, que é prefeito de Igrejinha e presidente da Associação dos Municípios do Vale do Paranhana (Ampara). "Já determinamos a suspensão do início de algumas obras, mas também devemos fazer cortes em valores que seriam destinados às atividades esportivas, bem como para alguns eventos", sinaliza.

 

A esperança que passa por Brasília

A complementação da parcela do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) deve tirar a corda do pescoço de muitos prefeitos. Já que a União repassará, nos próximos meses, o mesmo valor encaminhado às prefeituras em 2019 minimizando essas perdas.

"Neste momento, somente a União tem a capacidade de endividamento necessária para amenizar esta complexa adversidade", reitera Moura.

Numa segunda fase tramita no Congresso proposta de auxílio a Estados e municípios. Nos pontos mais sensíveis, e que enfrenta resistência, está a recomposição dos valores de ICMS.

O projeto segue a mesma lógica do FPM, entre os meses de abril e setembro, o que deixar de entrar - comparado ao ano passado - seja reembolsado pelo governo federal. Atualmente, o texto está em análise pelo Senado.

Estudo preliminar realizado pela Federação das Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), com base em números fornecidos pela Secretaria Estadual da Fazenda, indica que entre abril e junho, as perdas deste tributo devem ser próximas aos R$ 2,4 bilhões. Para os municípios, isto representará em torno de R$ 600 milhões a menos.

Segundo o prefeito de Harmonia e presidente da Associação dos Municípios do Vale do Rio Caí (Amvarc), Carlos Alberto Fink, sem um aporte da União a situação tende a ficar dramática nas cidades. Já que sem este montante é praticamente impossível manter investimentos. "Caso contrário (sem a complementação), poderemos viver uma situação dramática como a enfrentada pelo Estado e por Minas Gerais", afirma em relação às consequências que podem ser geradas aos Executivos municipais.

O secretário estadual da Fazenda lembra que, além do ICMS, a proposição inclui o Imposto Sobre Serviços (ISS). "O projeto contempla recomposição de tributos do Estado e também das prefeituras, por isso, é urgente ser aprovado", avalia Cardoso. 

Além disso, o ICMS faz parte da composição do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), que é um dos recursos vitais para ser aplicado no setor educacional dos municípios. "Nós estamos muito preocupados com este quadro", sintetiza Wilhelm.

Por que o ICMS é a maior preocupação?

Este tributo corresponde, em média, a 20% da arrecadação de impostos estaduais. “É cobrado em operações relativas à circulação de mercadorias e prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação, e também incide sobre outros impostos como PIS, CONFINS e Imposto sobre Importações, logo está representado na maioria da cadeia produtiva”, acrescenta o economista, ao ressaltar que ele atinge a maior parte dos brasileiros de forma direta ou direta. Isso ocorre, pois está presente nas ações industriais, comerciais e de prestação de serviços.

“Com a queda da atividade econômica, da mesma forma que aumenta mais que proporcionalmente comparado a outros impostos, quando diminui a atividade econômica, igualmente cai mais rapidamente sua arrecadação”, exemplifica o professor.

Repasses vão cair, adverte secretário

“É inevitável a redução nos repasses às prefeituras, pois são automáticos de acordo com a arrecadação. Ainda não é possível saber o tamanho exato da queda, mas como a receita do Estado será menor em abril consequentemente o repasse das prefeituras também”, é o que alerta o secretário Marco Aurélio Cardoso, que é conhece de perto as finanças gaúchas e o homem de confiança do governador Eduardo Leite.

Outra preocupação diz respeito aos repasses feitos aos hospitais, que serão fundamentais no atendimento à população, quando o pico do número de casos chegar ao Rio Grande do Sul.

“O governo tem feito todo o esforço possível para manter os repasses em dia para o bom funcionamento da área da saúde nesse momento extremo pelo qual estamos passando. O Estado depende da arrecadação própria de tributos para os pagamentos de forma geral, como saúde, folha de pagamento, fornecedores, por isso reforçamos a fundamental importância da recomposição das perdas de arrecadação para que os repasses e pagamentos continuem dentro de uma normalidade”, completa o titular da Fazenda.

Pente fino nos gastos

Em Novo Hamburgo, o home office foi adotado em grande parte dos serviços públicos. O impacto disso será sentido nos gastos com energia elétrica, combustíveis, telefone e outros custos que a atividade profissional presencial resulta.

"A diminuição foi muito grande", avalia Betinho. O titular da pasta da Fazenda ainda reforça que a comunidade não foi prejudicada, pois nenhum serviço foi afetado. O secretário sinaliza que, a partir de agora, o Executivo realiza avaliação de contratos para tentar reduzir despesas. Entre eles, até mesmo aluguéis estão sendo analisados. 

Por outro lado, o Município recebeu mais de R$ 5 milhões do governo federal, que pagou o valor correspondente a dois tetos da alta complexidade, bem como entraram nos cofres montantes aos repasses feitos pela Câmara de Vereadores. "Isso será repassado a uma conta específica para o combate à Covid-19", afirma Betinho.

 

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