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Notícias | Região SOBREVIVÊNCIA

Salário mínimo deveria ser de R$ 6 mil para atender as necessidades dos brasileiros

Valor atual de 1.212,00 é insuficiente para despesas como alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência

Por Raquel Kothe
Publicado em: 07.12.2022 às 09:21 Última atualização: 07.12.2022 às 11:11

As contas dos brasileiros estão difíceis de fechar. A maioria, que tem trabalho formal, mal recebe o salário e os valores já são utilizados para pagar as contas do mês e para as dívidas contraídas. A moradora do bairro Harmonia, de Canoas, Michele Cristina, é um exemplo de quanto é necessário "fazer mágica" para atender todas as despesas.

Cesta básica na capital custa mais que 63% do mínimo
Cesta básica na capital custa mais que 63% do mínimo Foto: Paulo Pires/GES


Segundo dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o salário mínimo atualmente deveria ser de R$ 6.458,86 para atender despesas como alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência. O valor é 5,2 vezes maior que o piso federal atual, de R$ 1.212,00.

Enquanto isso, o valor do conjunto dos alimentos básicos aumentou em 12 das 17 capitais onde o Dieese promove mensalmente a Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos. Entre setembro e outubro, as altas mais expressivas ocorreram em Porto Alegre (3,34%), Campo Grande – MS (3,17%) e Vitória – ES (3,14%). Porto Alegre foi a capital onde os alimentos básicos apresentaram o maior custo – R$ 768,82 – o equivalente a 63,43% do mínimo, seguida de São Paulo e Florianópolis.

Malabarismo

Michele trabalha como recepcionista em Porto Alegre e mora com o marido e com o filho de dez anos. A renda da família é de cerca de R$ 5 mil. Para dificultar a situação econômica do casal, o marido ficou desempregado por um período, mas já voltou a trabalhar. O filho deles é autista, usa medicamentos e ainda usa fraldas. "Essa parte já come R$ 800,00 do nosso orçamento", relata. Eles não têm acesso a benefício governamental. "Porque para ganhar teríamos que ser miseráveis", analisa.


O casal ainda paga a prestação da casa e os custos com cartão de crédito. E desde a pandemia, os salários foram reduzidos, enquanto os preços dos alimentos cresceram. "Como é impossível diminuir a comida, as fraldas e os remédios, assim como o plano de saúde, tivemos que cortar vários custos, como o churrasco de final de semana e presentes de aniversário. E mesmo assim a dívida no cartão de crédito só cresceu", relata. Hoje a média de saldo de endividamento no cartão de crédito da família é de R$ 7 mil ao mês.

Superendividados

O Procon de Canoas, implantou em outubro atendimentos do Núcleo de Apoio ao Superendividado (NAS). O serviço é gratuito e tem o objetivo de orientar e renegociar as dívidas dos consumidores de Canoas e de Nova Santa Rita. "Queremos resgatar a dignidade e a cidadania dos superendividados, oportunizando conciliação e mediação em grupo, conforme o orçamento familiar, de modo a garantir a subsistência básica das famílias e proporcionar um novo recomeço no mercado de consumo", destaca a diretora do Procon do município, Taís Marques.

Por enquanto a procura pelo serviço ainda foi tímida. Os consumidores interessados em buscar o serviço podem se dirigir ao Procon de Canoas e aos Centros de Acessos aos Direitos (CAD), localizados nos bairros Guajuviras, Mathias Velho e Niterói. O horário de funcionamento é de segunda a sexta, das 8h30 às 17h30, por ordem de chegada.

O núcleo também tem como objetivo proporcionar educação financeira aos consumidores e a promoção de práticas de crédito responsável pelos fornecedores. "Sabemos que sem a devida reeducação, os problemas antigos continuarão. Por isso, parte do nosso atendimento é justamente com um acompanhamento multidisciplinar", explica a diretora. Taís lembra que a saúde financeira das famílias afeta diretamente o convívio familiar, assim como a saúde mental dos envolvidos. "Por isso também esse esforço", destaca.

Guisado de segunda

O economista e professor da Unilasalle, Moisés Waismann, destaca que a Constituição Federal diz que o salário mínimo tem que cumprir as necessidades básicas do indivíduo. Já a Economia entende que o salário é uma questão de subsistência para o trabalhador. "O que ocorre estruturalmente, é que o salário mínimo que seria uma referência, passa a ser o mínimo institucionalizado. Sempre que se tenta valorizar o mínimo, as organizações e o mercado entram em colapso", alerta.

Moisés traz o exemplo do piso da categoria dos profissionais da enfermagem. "Tão reverenciados durante a pandemia e neste ano, quando se estipulou um piso mínimo, as casas e redes de saúde alegaram que não tinham como pagar", ressalta. Para ele, este é um problema estrutural de países capitalistas, periféricos e atrasados. "Uso essas expressões como substantivo, não como adjetivo. Não se trata de juízo de valor", contextualiza.

"O povo brasileiro está se endividando para comprar guisado de segunda, gás de cozinha, morar longe, pagar a luz e a internet, não para viajar. É para sobreviver. Quero muito acreditar que no próximo período o salário mínimo será revigorado e que o mercado nacional se aqueça", deseja o professor. Moisés lamenta que o próximo governo encontrará uma realidade muito diferente de 2002, tanto na economia externa como na nacional. "Será um trabalho hercúleo. Sei que tem vontade e tem competência, mas a negociação não será fácil", avalia.

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