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Notícias | Região ENTREVISTA

Novo presidente da Trensurb aposta em crédito de carbono para garantir tarifa baixa

Fernando Marroni assumiu presidência da estatal, que não será mais privatizada, nesta semana

Publicado em: 30.06.2023 às 10:32

Após meses de espera, Fernando Marroni tomou posse no começo da semana como novo presidente da Trensurb. Formado em Engenharia Elétrica pela Universidade Católica de Pelotas(UCPel) e servidor público da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Marroni tem uma longa trajetória política dentro do PT, mesmo partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Trensurb busca reduzir dependência do governo federal e manter tarifa com preço baixo | Jornal NH
Trensurb busca reduzir dependência do governo federal e manter tarifa com preço baixo Foto: Lucas Quadros/Trensurb

Ex-prefeito de sua cidade natal, Marroni também foi deputado federal e estadual. Como parlamentar atuou na área do transporte público. Agora, assume a direção de um dos mais importantes modais da região metropolitana. Nessa entrevista exclusiva ele fala um pouco sobre os projetos e como pretende gerir a empresa.
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Marroni antecipa que não deve propor aumento de tarifa e projeta a busca por outras formas de receita para a empresa estatal.

O senhor se afasta um pouco da política partidária para comandar uma importante estatal. Como está sendo essa transição e o que senhor vê como sendo algo importante para a Trensurb e seus usuários?

Fernando Marroni - A nossa compreensão do sistema de transporte público como um todo é que é uma política pública importante para diminuir as desigualdades sociais. Tendo em conta uma tarifa de R$ 4,50 no trem, um trabalhador que recebe um salário mínimo e viaja cinco dias por semana ida e volta vai consumir 13% a 14% do salário em transporte. Isso é algo que merece atenção do governo com uma política pública para minimizar esse impacto de deslocamentos.

E como não está submetido à ideia do mercado, evidente que precisamos de uma empresa pública que preste esse serviço. Felizmente, agora, temos essa posição do governo federal de tirar o Trensurb do PND (Programa Nacional de Desestatização). Isso significa que precisamos fazer todos os esforços para ter uma modicidade tarifária para que o trem seja atrativo para o usuário, que ele dê o máximo de segurança, conforto e pontualidade aos passageiros.

Como é um transporte coletivo com energia renovável, nos possibilita ter uma receita de crédito de carbono, que seria tantos passageiros que deixaram de ser transportados com óleo diesel e monetizar isso.

Precisamos fazer todos os esforços para ter uma modicidade tarifária para que o trem seja atrativo para o usuário

A empresa precisa buscar um equilíbrio financeiro, porque hoje o governo federal subsidia R$ 70 milhões ano. E trabalhar os principais custos que a empresa tem, que hoje é a energia, e para isso tem possibilidades de ter autogeração, energia solar e mudar a contratação que temos de fornecimento de energia, não é possível ficarmos como consumidor cativo da RGE.

Evidentemente no novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) que o governo federal está trabalhando já tem manifestação do Estado, da assembleia participativa que teve aqui, de incluir no PAC a extensão de linhas.

Fernando Marroni, novo presidente da Trensurb | Jornal NH
Fernando Marroni, novo presidente da Trensurb Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

O senhor fala em manter a modicidade da tarifa, em contrapartida, a gestão anterior apontava para a dificuldade em manter a operação com a tarifa baixa. Como manter essa tarifa baixa e se investir em outros pontos como segurança da via, qualidade dos trens e bilhetagem eletrônica?

Marroni - No curtíssimo prazo, não vamos ter impacto dessas questões de mudança da energia, crédito de carbono e exploração dos imóveis, mas nós temos o orçamento da União. Este é um patrimônio da União e ela quer manter essa regularidade. A manutenção é via orçamentária, nem que isso signifique no balanço geral aumento de subsídio. Isso não é um aumento de subsídio, mas é pontualmente uma verba especial para solucionar problemas de operação.

E como seria a política de crédito de carbono para que a Trensurb tenha recursos através dela?

Marroni - Já existe comercialização de crédito de carbono e nós queremos entrar nela, inclusive em bolsa. Nós temos que monetizar o que significa retirar 110 mil passageiros dia do transporte coletivo, porque isso tem uma emissão de carbono e é isso que vamos monetizar. É uma nova diretriz da empresa que não existia, como é da compra de energia e da própria instalação de painéis solares, tornando todas as estações autossuficientes e ainda ter um impacto no próprio combustível do trem.

Então a ideia para os próximos anos é investir nessa questão energética?

Marroni - Não queremos fazer investimentos, queremos fazer PPP (Parceria Público Privada), ou seja, faz a instalação e tem esse retorno para a empresa sem fazer investimentos. Temos que fazer uma conta também, porque hoje em dia existem recursos disponíveis de fundos de desenvolvimento sustentável que são com juros muito baixos, e isso talvez seja oportuno para que se capte um recurso desses e se faça instalação de painéis solares. Para nós é uma questão de conta matemática, o que é mais interessante do ponto de vista e receita para o trem.

Existe algum prazo?

Marroni - No serviço público eu já aprendi uma coisa, não se pode dar prazo, ainda mais que é uma empresa vinculada ao governo federal, então sempre causa um atraso aqui e ali e o pessoal fica cobrando. O que é importante para nós é que vamos desenvolver os projetos o mais rápido possível porque queremos dar sustentabilidade ao trem.

Em relação à antiga gestão, qual sua avaliação em avanços ou não na administração da empresa?

Marroni - Estamos fazendo um diagnóstico ainda, não temos uma ideia sobre isso. O que é importante na nossa opinião é que o trem continua tendo por parte da população uma boa nota, digamos assim, os indicadores que temos é que o trem é uma empresa bem conceituada pelos usuários. Evidentemente que pode esconder alguma coisa de operação que nós temos, das vias que estão há bastante tempo sem manutenção e dos veículos. Como a empresa tinha uma diretriz de privatização, evidentemente deixou um pouco a desejar nesse tema de manutenções que a gente precisa identificar imediatamente.

Um dos grandes problemas que tem sido sentido pelos usuários é quanto ao roubo de cabos, o que torna mais lenta a viagem. Que forma o senhor enxerga para minimizar esse problema?

Marroni - Essa é uma realidade no país inteiro. Aqui já foi expedido por nós uma prioridade nesse tema do roubo de cabos. Não vamos evitar o roubo de carros enquanto eles estiverem expostos. Temos que ter uma solução definitiva, porque o trem não pode parar, tem que ter regularidade e tem que ter a confiança dos passageiros nessa pontualidade.

Já há alguns anos tivemos uma mudança nos intervalos dos trens, que ficaram maiores. Se pensa em reduzir o período de espera do trem?

Marroni - O período correto, via de regra, nas linhas de transporte metropolitano é de 4 a 5 minutos, isso seria o ideal, mas precisamos ter passageiro para tanto. Se temos um subsídio bastante elevado e viajarmos ociosos com poucos passageiros, isso tem um impacto na tarifa. Claro que encurtar esse período depende também do número de passageiros que seremos capazes de atrair daqui para a frente.

Temos o investimento de um intermodal em Novo Hamburgo...

Marroni - Na verdade era um investimento privado que a Trensurb utilizou desse instrumento para ter arrecadação, e o empreendedor privado abandonou o projeto. Então temos que, dentro dessa diretriz de aproveitar os imóveis, ter projetos que envolvam a interligação entre os transportes rodoviários e o trem, e envolva o comércio e atividades que possam gerar receita.

Atualmente, o tema transporte público causa grande preocupação para os prefeitos da região metropolitana...

Marroni - Não, preocupa todo o governo. Primeiro, não é possível mais sustentar o transporte coletivo público com tarifa. Todas as prefeituras estão dando subsídio, então precisamos tratar isso como uma política pública nacional e ter uma nova forma de financiamento para subsidiar o transporte coletivo de massas, que é para quem queremos dedicar nosso governo. Exatamente aqueles que são mais prejudicados, como citei o caso do trabalhador. É um problema nacional, não local, e evidentemente tem que ser enfrentado como tal.

O antigo presidente da Trensurb tinha uma leitura que era um momento de expandir a operação mais para região Norte de Porto Alegre e as cidades ao redor. Como o senhor visualiza esse tema?

Marroni - Não é uma decisão nossa, da Trensurb. O que podemos é aportar conhecimento técnico de viabilidade. Mas essa é uma decisão do governo do Estado, da Granpal (Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre). É claro que há muito maior viabilidade para o transporte de massa nessa região que você refere. Esse eixo da região metropolitana que não está sendo atendido.

Tem uma diferença também, porque Viamão e Alvorada, por exemplo, são cidades muito vinculadas a Porto Alegre, as pessoas buscam serviços e emprego em Porto Alegre. Não é o caso de Canoas, que é uma cidade autônoma praticamente, assim como Novo Hamburgo e São Leopoldo. Ainda mais com a mudança de serviços, em que tudo é digital, ninguém precisa mais ir para Porto Alegre para ir no INSS ou coisa parecida.

No futuro queremos um transporte sustentável que possa se expandir mais, ser interurbano...porque o automóvel individual está com os dias contados

Então, tecnicamente, está correto dizer que a região Norte de Porto Alegre é a mais adensada e que precisaria mais. Mas há uma demanda também no médio e longo prazo. A Trensurb tem 40 anos e, a não ser aquele aumento durante o período da Copa, não teve outra expansão. Quantos quilômetros tem da última estação até Caxias? Não mais de 70 km.

No futuro queremos um transporte sustentável que possa se expandir mais, ser interurbano. Se trata disso, de pensar para o futuro, porque o automóvel individual está com os dias contados. Não tanto porque é caro e emite carbono, é porque é insuportável para as cidades o volume de automóveis.

Há cerca de 10 anos tínhamos o transporte mais integrado com apenas um bilhete eletrônico, o que hoje quase inexiste. Por que isso retrocedeu? 

Marroni - Os transportadores (privados) não confiam um no outro, então fica cada um com sua caixinha e sua tarifa. E este papel é da Metroplan, ela é a instituição capaz e responsável para fazer a integração e gestão do transporte metropolitano. Evidentemente que vamos procurar a Granpal, prefeitos e governo do Estado e colocar isso: o que significa a gente integrar, inclusive, de custo para o passageiro. E isso pode melhorar o sistema. Já que não nos provocam, vamos provocar.

Eduardo Amaral

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