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Notícias | Região Efeito pandemia

Há um ano, abraços e momentos que ficaram na saudade

A vida foi diferente nos últimos 365 dias. Mais difícil, mas sempre com esperança por tempos melhores

Por Bianca Dilly
Publicado em: 27.03.2021 às 05:00 Última atualização: 27.03.2021 às 09:54

Dona Renata e a neta Letícia estão há um ano sem poder se abraçar Foto: Arquivo Pessoal
É com a voz embargada que a autônoma aposentada Renata Maria Becker, 85 anos, conta sobre uma das coisas que mais sente falta em um ano de pandemia: abraçar os netos. Depois de praticamente criar os 'segundos' filhos, a moradora de Ivoti precisou se acostumar a uma nova realidade. Com o mesmo amor, sim, mas sem o afeto do toque, o calor do contato.

E assim como têm sido os dias para a dona Renata, há mais de um ano a vida de toda a população sofreu mudanças. Entre 16 e 20 de março de 2020, trabalhadores passaram a fazer da casa o escritório, estudantes transformaram o quarto em sala de aula, compromissos foram riscados das agendas e ingressos comprados acumularam pó em meio à estante.

Só que quando as adaptações surgiram, se imaginava que durassem duas, três semanas. Agora já estão aí, há mais de 365 dias - e contando. De lá para cá, o calendário não deixa enganar. Um ano sem o abraço entre gerações. Um ano sem encontrar os amigos. Sem ir ao estádio de futebol ou poder acompanhar a missa na Igreja. Um ano sem aulas presenciais, sem passar pelos corredores e biblioteca da universidade. Um ano sem ir ao restaurante, cinema, show. Um ano.

A vida mudou

Para uma das netas da dona Renata, a representante de desenvolvimento de vendas Leticia Becker Belmonte Alves, 19, é difícil segurar a vontade de abraçar. "Eu sempre tive uma relação muito próxima da minha avó. Até 2010, morávamos juntos. Só que, com o início da pandemia, ficamos extremamente preocupados", diz, acrescentando que algumas mudanças foram necessárias, com o objetivo de proteger dona Renata.

Além de manter a distância física segura, a rotina da ivotiense se transformou. "Nos primeiros meses, ela não ia na nossa casa aos finais de semana, como de costume. Levávamos comida e fazíamos as compras no mercado. Tentamos evitar o contato dela com o mundo exterior o máximo possível", relata Leticia.

Apesar de entender que a preocupação é por sua saúde, a avó sente falta do que fazia há um ano. "Não é fácil. A gente espera a hora de poder abraçar. Não posso ir na vizinha e quase não a conheço mais. Não posso ir em outros lugares, só em casa", diz. Até mesmo o contato com a netinha que nasceu um pouco antes de tudo isso começar, não é como ela desejaria. "A pequeninha tem um aninho e não posso pegar muito ela no colo. Mas também porque é pesada para mim", brinca.

Um ano distantes

Quem também passa por situação semelhante é a professora Isadora Dhein de Oliveira, 22, de Lindolfo Collor. Ela está há um ano sem encontrar com a avó Maria Lucena Dieter, 87, de Estância Velha. "Costumávamos nos ver em almoços de domingo. Reunia a família e ela amava isso. Só que desde que começou a pandemia eu não fui mais lá, porque o receio estava bem grande", relata.

Agora os contatos se restringem aos proporcionados pela tecnologia. "Sinto muita saudade. O sentimento é de tristeza por pensar que, infelizmente, a cada ano nós estamos mais perto de 'perder' ela de certa forma", lamenta. Ainda assim, Isadora compreende que a medida é necessária. "Ter ficado esse tempo todo longe foi muito doloroso, mas ao mesmo tempo sei que é pelo bem dela", evidencia.

Saudade e esperança

Para amenizar a saudade, da mesma forma, Letícia conta que liga para a avó todos os dias durante a semana. "Decidimos comprar um celular novo para fazermos videochamadas, ela ver a gente e a netinha de 1 ano", diz.

Agora, a esperança da idosa está depositada no processo de imunização. "Fiz as duas vacinas e vamos ver como tudo vai continuar", resume dona Renata. Segundo a neta, a primeira dose foi aplicada em fevereiro e a segunda neste mês. "Tivemos a felicidade dela fazer a CoronaVac aqui em Ivoti, mas mesmo assim estamos tomando muito cuidado, devido à situação atual da doença no Brasil", finaliza.

Psicóloga fala sobre dificuldades enfrentadas

De acordo com a coordenadora do curso de Psicologia da Universidade Feevale, Claudia Maria Teixeira Goulart, é inevitável o impacto após um ano de restrições. "Além do isolamento, há o medo, as perdas financeiras, de emprego, de pessoas da família e conhecidos. Em um primeiro momento, temos que nos permitir aceitar que nem sempre vamos estar bem", frisa, acrescentando que vivemos uma situação intensa, que naturalmente leva as pessoas a se sentirem tristes e ansiosas por vezes.

Na sequência, Claudia dá algumas dicas para encarar esses sentimentos. A primeira delas tem relação com a resiliência, ou seja, a capacidade de lidar com dificuldades e conviver com elas. "Talvez o que ajude é não fazer planos a longo prazo. Ir vivendo cada dia e lidar com as situações da forma que elas vão se colocando. O melhor é não querer se antecipar, porque é algo que foge do nosso controle", lembra.

 

Interação entre as pessoas pode ser adaptada

Apesar de não existir uma fórmula infalível para amenizar o possível sofrimento, a especialista orienta que sejam buscadas formas de autocuidado nesse processo. "Coisas que nos façam sentir bem. Maneiras de se encontrar com as pessoas, mesmo que não sejam presenciais. Por ligação, chamada de vídeo. Encontrar pessoas que compartilhem do nosso sentimento é muito importante", afirma. Como somos seres sociais e necessitamos desses momentos de interação, a professora cita que o apoio da tecnologia, como feito por Letícia e Isadora, é benéfico.

 

Um ano sem encontrar os amigos

Encontros fazem falta para Dhaniela (D) Foto: Arquivo pessoal
O que em tempos passados era rotina para a social media Dhaniela Weiss, 27, de Estância Velha, agora parece ter virado boas memórias, registradas em fotografias. São os encontros com amigos, que ela adorava, mas não realiza há um ano. "Antes tínhamos uma frequência maior de nos vermos. Saíamos para jantar ou fazer algo na casa do outro. São coisas que hoje infelizmente não estou fazendo mais", conta.

Nem mesmo os passeios durante o dia são possíveis. "Íamos em parques para tomar tererê, sentar na grama e conversar até anoitecer", relembra. Para se sentir mais próxima, ela também busca as redes sociais e aplicativos. "A gente se fala quase todos os dias pelo WhatsApp ou Instagram e também por videochamada. Só que não é a mesma coisa", comenta.

A jovem sonha com a aceleração da imunização. "Estava acreditando que até junho todos estariam vacinados, mas pelas métricas está tudo tão distante... Ainda assim, o sentimento é de esperança para tudo isso acabar", confia. Quando as coisas melhorarem, ela quer abraçar seus amigos e familiares.

 

Um ano sem frequentar a missa

Vanessa em visita ao Santuário Padre Reus Foto: Arquivo pessoal
Desde bem jovem, a leopoldense Vanessa Schimidt, 25, frequentou ativamente a Igreja Católica, principalmente a Paróquia Nossa Senhora Aparecida, no bairro Scharlau. "Agora, minha família e eu acompanhamos a missa pela Internet", comenta, sobre uma mudança na rotina.

Para ela, a cerimônia on-line não traz o mesmo sentimento. "Não sinto aquele contato com a Trindade Santíssima como eu sentia antes, indo à Casa do Senhor. A comunhão também não acontece e sequer a bênção do padre, que eu pedia sempre que me sentia triste, fraca, eu consigo pedir. Não é a mesma coisa dos encontros presencias", lamenta.

Para manter a conexão religiosa, Vanessa procurou outras alternativas. "Montei um altar em casa, onde acendo minha velinha e faço minha oração diária. O altar é pequeno, mas a intenção é grande", descreve.

Quando puder voltar a frequentar a Igreja, ela já sabe o que vai fazer. "Quero agradecer a Deus por ter mantido a minha fé e esperança, ter guardado minha família e rezar pelos diversos amigos e conhecidos que perdi para a Covid", aponta.

 

Um ano sem aulas presenciais

Santos (E) sente saudade da universidade Foto: Arquivo pessoal
Para o estudante de Direito Vinícius Santos, 21, morador de Gramado, uma das principais saudades deste um ano de restrições é a das aulas presenciais. "Na sala de aula dá para ficar mais perto do professor, os debates têm mais energia e é melhor para tirar as dúvidas", lista.

Mas, além disso, o espaço físico também provoca nostalgia. "Por mais que a universidade tenha um acervo digitalizado enorme, ter acesso à biblioteca faz toda a diferença. E, nas semanas de provas, eu costumava chegar mais cedo para estudar junto com os colegas lá", recorda Santos.

O próprio contato com outros estudantes não é mais o mesmo. "O convívio está fazendo muita falta. Conheci pessoas incríveis durante o curso, com as quais tenho laços fora da universidade. Tenho amigos inseparáveis e a gente sempre se reunia, fosse para conversar, fosse para uma janta", comenta.

Nos últimos semestres da faculdade, ele diz que ainda não sabe como será essa fase final. "Minha meta é a formatura, independentemente de ter solenidade ou não. O que quero é concluir, para poder exercer a profissão", diz.

 

Um ano sem ir ao estádio de futebol

Ir ao estádio é uma das paixões de Marina Foto: Arquivo pessoal
A jornalista Marina da Rosa Staudt, 24, de Novo Hamburgo, lembra muito bem da última vez que fez uma de suas coisas preferidas na vida: foi no dia 12 de março de 2020. A data remete ao primeiro Gre-Nal da Libertadores, acompanhado por ela na Arena do Grêmio. "Para mim está sendo bem difícil não poder ir ao estádio, porque era algo que eu fazia com muita frequência. Estava presente em praticamente todos os jogos do meu time, sempre que meus compromissos permitiam", relata.

Sozinha, com os amigos ou a família - ela diz que sempre dava um jeitinho de estar presente nas partidas. "Então, sinto muita falta, porque fazia parte da minha rotina e era muitas vezes um escape, uma distração. Era meu lazer semanal, algo que eu amava muito", detalha.

Agora, Marina busca outras formas para sentir o clima do estádio. "Como os campeonatos seguiram, eu procuro assistir pela televisão o máximo de jogos possível. Era algo que eu já gostava também, mas assim eu sigo próxima do futebol. Também converso bastante com as minhas amigas, relembrando histórias e tudo mais", conta.

 

Um ano sem teatro, cinema, restaurante...

Mendonça (D) está sem poder subir no palco Foto: Arquivo pessoal
Cinema, show, restaurante, barzinho. O ator Eduardo Mendonça, 35, morador de Canoas, desconhece o que são esses espaços há um ano. "E tem uma atividade específica, que tem relação com a minha profissão, que é o teatro, o palco. Sinto muita falta não só pelo ganho financeiro, mas porque é um trabalho muito prazeroso de fazer", sublinha.

Ele, que se diz "da rua", conta que estava sempre buscando um novo roteiro pela cidade. "Agora o circuito se reduziu à minha casa. Com isso, fico chateado, mas sei que o mundo todo está. Fico aflito, ansioso, é uma mistura de sentimentos. De vez em quando dá raiva. Dá tristeza. Mas é uma montanha-russa que todo mundo está passando", argumenta.

Mendonça tenta evitar a saudade. "Busco não pensar muito, mas a gente acaba sentindo. Já assisti peça on-line, que é uma solução interessante, mas nada substitui o ao vivo", analisa.

Como principal subterfúgio, o ator celebra a aproximação com o filho. "Como ele ficou sem escola presencial no ano passado, passou bem mais tempo na minha casa", completa.

 


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